terça-feira, janeiro 29, 2013

Portuguesas Assustadoras



Nesta segunda-feira (28), os havaianos Kealii Mamala e Garrett McNamara encararam ondas gigantes na Praia do Norte, em Nazaré, Portugal.

Na base do tow-in (modalidade em que o surfista é puxado para a onda por um jet-ski, já que seria impossível entrar na onda remando), Garret encarou ondas que, para alguns especialistas, são as maiores já surfadas na história. Em 2011, Garrett já havia inscrito seu nome no Guinness Book ao dropar, nesta mesma praia, uma bomba d´água de cerca de 78 pés, o equivalente a aproximadamente 25 metros.

Especialistas ainda tentam calcular o tamanho das morras portuguesas surfadas ontem.

* com informações do site Waves


segunda-feira, janeiro 28, 2013

Jamais verão estação igual a esta


Alguém aí viu o verão brasiliense que deveria estar aqui?

Visto pela última vez no início de janeiro, ele estava bem forte, todo vestido de azul e dourado. De repente, sumiu sem deixar vestígios.

Desde então, só se vê água nesta cidade. E eu, em pleno verão, dormindo com um cobertor e saindo às ruas, de noite, de blusa de manga comprida.

E eu que dizia a todos que na capital federal até a chuva parecia regulamentada por decreto; por um projeto de lei estabelecendo que só chova o necessário para aguar os jardins e que, mesmo quando forte, a chuva deve cessar em no máximo vinte minutos e, se necessário, só recomeçar após um espaço de tempo suficiente para eu continuar minha caminhada e chegar onde preciso.

Estrepei-me. Isso aqui este mês tá parecendo Santos. Pior. Tá parecendo Ubatuba. A ponto de na semana passada eu aceitar o conselho da madrinha Naninha e forrar meu sapato de legítimo couro italiano com sacolas plásticas do supermercado.

Como se vê, um sujeito semifosco pode até deixar a pobreza, mas a pobreza não o deixa.

domingo, janeiro 27, 2013

O compositor cronista


Enterrem meu cartão de crédito na curva do rio. Por favor! Eu vos imploro, pois estou sofrendo compulsivamente, compulsoriamente.

Já prometi a mim mesmo não voltar a comprar mais nenhum livro até conseguir pôr em dia a leitura e dar cabo da pilha de obras que vão se avolumando no meu compartimento secreto - uma dispensa transformada em biblioteca -, mas quem resiste a um Aldir Blanc no sebo.

Para quem não está juntando lé com cré, trata-se do compositor, psiquiatra e boêmio carioca da safra de Millôr, Jaguar e companhia (surfistas, skatistas e roqueiros, meus três habituais leitores talvez não os conheçam), de quem ele deve ter recebido boas dicas para escrever crônicas tão saborosas e divertidas quanto as reunidas neste Rua dos Artistas e Transversais (ed. Agir, 2006, 428 páginas). E para quem pensa não conhecer o moço nascido em 1946, bom, Aldir é compositor de diversas músicas conhecidas, parceiro de João Bosco, Ivan Lins, entre outros.

Frasista de mão cheia ("tudo em ordem na mais completa desordem"; "meu avô, comovido até os suspensórios"; tinha a cinematográfica segurança das pessoas falsamente virtuosas"; "a infância é uma idade na qual são permitidas só algumas das infantilidades dos adultos"), nos momentos mais inspirados Aldir chega a lembrar o Nelson Rodrigues das crônicas de Óbvio Ululante. Debochado ("Quando a mulher ia quase na esquina, partindo digna como uma vaca ao crepúsculo, o Pombo saiu feito louco na calçada. De camiseta, cuecas, meias brancas e sapatos-tanque, com as mãos em concha e lágrimas nos olhos, pôs-se a gritar: - Volta! Pelo amor de Deus. Voooltaaa! Que nem um beque [zagueiro] central de time de subúrbio"), me lembrou Lima Barreto. Apologista dos poderes revigorantes dos bons amigos, do bom copo e de um bom papo, Aldir consegue condensar em uma crônica parte do que mais relevante a vida tem a ensinar.



quarta-feira, janeiro 23, 2013

É o dinheiro, estúpido



Após sete anos vivendo em Brasília, uma das capitais com o mais alto custo de vida do país, acho que comecei a entender como se dá este tal de processo inflacionário - um fantasma que muitos insistem em dizer estar sob controle.

Pois então, vejamos.  Fundamentos não tão básicos para quem se ferra pela economia dos outros. 

Um belo dia, o dono de um apartamento de 48 metros quadrados em um prédio de algumas décadas acorda e decide pôr o imóvel à venda. Por alguma razão subjetiva, conclui que sua propriedade sem garagem vale R$ 550 mil. 

Ao ficar sabendo disso, o dono de um outro imóvel próximo avalia obtusamente que o seu apartamento de 157 metros quadrados e uma vaga de garagem deve valer no mínimo três vezes o do quase vizinho. E fixa em um milhão e setecentos mil reais o preço a ser pago por eventuais interessados.

Entre uma oferta e outra, os donos de outros imóveis vão pedindo diferentes preços, de acordo com a pressa em se ver livre do abacaxi. O problema é que há muita gente que compra imóvel não  para morar ou guardar seus livros e sim para "viver de renda", ou seja, do aluguel pago por quem não tem condições de comprar a casa própria. E como os especialistas sugerem que o investimento só vale a pena se for possível obter, mensalmente, algo entre 3% e 6% do valor total da morada, a exorbitância acaba pesando no bolso de todos, principalmente daqueles que sequer cogitam como alguém consegue juntar R$ 1,7 milhão. 

E então, um sujeito resolve pedir R$ 1,2 mil só de aluguel em um ... bem, em um esquisito apartamento de um quarto e um catre cujo dono insiste se tratar de outro quarto. O lugar fica em cima de um comércio, numa quadra não das mais seguras, não tem garagem e nem box no banheiro, mas, em compensação, tem um "terraço" que nada mais é que a laje do edifício, um espaço por onde um ladrão com disposição e algum tempo pode entrar e cortar a garganta do inquilino. 

Assim como no caso dos apartamentos à venda, uma vez que isso é anunciado não demora para que um outro proprietário/investidor que não quer passar atestado de otário decide que seu bem de dois quartos, sendo uma suíte, e três vagas na garagem, não pode valer menos de...R$ 6 mil. O ALUGUEL! E, novamente, surgem as ofertas intermediárias. 

Ocorre que, no caso das ofertas de aluguel, em Brasília há um outro interessante aspecto a contribuir para as distorções econômicas: o Estado enquanto indutor da inflação. Traduzindo: na capital federal, alguns privilegiados servidores públicos, incluindo parlamentares, recebem, além de seus salários, o chamado auxílio-moradia. E quando o preço dos aluguéis sobe, o benefício é reajustado de forma a compensar a alta. Somado ao fato de que a procura por apartamentos no Plano Piloto é maior que a oferta, o dinheiro público gasto em auxílio-moradia acaba por estimular os locatários a pedirem valores cada vez mais fora da realidade. 

A questão é que tudo isso acaba por se torna uma "inexorável realidade econômica" contra a qual não se pode lutar. Como o mercado é livre para se auto-regular, resta a quem não trabalha no serviço público, mas tem qualificação e é valorizado, incluir esses custos na negociação salarial. E para a maioria, que não se encaixa em nenhum dos dois casos anteriores? Resta o metrô ou o ônibus igualmente lotado para uma das cidades-satélites. 

Só que o Plano Piloto não é uma ilha auto-suficiente e mesmo que a manicure do salão onde você tira cutícula não more no Plano Piloto, o dono da padaria onde ela toma café ao chegar pra trabalhar mora. E para continuar morando, ele não hesita em repassar para o preço do pãozinho a alta do seu custo de vida. Assim como as companhias fornecedoras de água e luz, que contrata muita gente qualificada capaz de reivindicar e obter a reposição da perda inflacionária e que, ao conceder um aumento, acaba por compartilhar o prejuízo entre as contas que envia para a casa de milhares de cidadãos que não moram no Plano Piloto. Entre elas, a sua manicure. 

Agora, adivinha quem vai ajudar a moça a manter a luz e a água da casa dela? Ou a margem de lucro do banco onde você tem conta, já que a instituição também vai passar a pagar mais de luz, água e salários? 

E por aí vai, em um efeito cascata que termina por obrigar a quem vive de renda a cobrar mais de aluguel para continuar podendo pagar academia, escolinha de futebol do filho, plástica da esposa, eventuais presentes para a amante do marido e as compras em New Iorque. 

sexta-feira, janeiro 18, 2013

Reclamações ADES


A questão de consumir alimentos à base de soja se tornou um conflito ético desde que visitei o Mato Grosso do Sul, há alguns anos. Ao ver as extensas plantações da leguminosa e os efeitos que a crescente demanda do produto provoca não só para o meio-ambiente, mas também para as populações tradicionais, sobretudo para as comunidades indígenas, fiquei tentado a pelo menos reduzir a compra desses produtos.

Vale dizer que, para mim, esse não é um conflito de fácil resolução, já que, recentemente, fui diagnosticado como tendo uma intolerância à lactose, o que me levou a aumentar o consumo dos sucos de soja. Além disso, é preciso considerar que o meu consumo não é assim tão impactante, já que boa parte da soja plantada é usada para...alimentar gado.

Esta semana, o que era apenas uma preocupação sócio-ambiental ganhou um importante componente para que eu tome uma decisão: agora é uma questão de saúde. Pública.

Na terça-feira (11), abri uma caixa de ADES que havia comprado pouco tempo antes, mas válida até o dia 03 de maio deste ano. Como já tinha jantado na rua, tomei um único copo (é comum eu virar 3/4 da caixa de uma única vez) e fui dormir. Já no dia seguinte comecei a me sentir indisposto. Inicialmente, achei que não fosse nada, que podia ter `misturado´ algo que não caiu bem, muito embora eu não tivesse comido nada suspeito.

A coisa piorou na quinta-feira (13), dia em que eu mal consegui me concentrar no trabalho devido à dor de cabeça e a um enjôo insistente. Mesmo sem muita fome, consegui empurrar o almoço pra dentro e segurar a onda até voltar pra casa no fim do dia. Tomei um Eparema, dei um tempo até que um indício de fome surgisse e pensei comigo: "Vou comer algo leve pra ver se melhoro". E apanhei na geladeira a caixa de Ades aberta apenas dois dias antes e da qual, lembrem, já havia tomado um copo.

Qual não foi minha surpresa ao levantar a tampa e notar pequenas manchas pretas no bocal da caixa. Não havia cheiro e o aspecto era normal, talvez apenas um pouco mais ralo que de costume. Mesmo assim, fui até o banheiro e despejei um pouco do líquido. E então, algo estranho, preto, começou a surgir.  Perplexo, peguei a tesoura e abri a caixa. O que havia dentro?

Veja as fotos abaixo e reflita sobre o quão saudável pode ser este produto. Outra surpresa foi ser informado pela Anvisa e pela Vigilância Sanitária do Distrito Federal que eles não aceitam denúncias diretamente contra o estabelecimento que produz o produto - no caso, a multinacional Unilever -, mas apenas contra o estabelecimento onde eu o comprei, mesmo eu dizendo que, aparentemente, não havia problema com a comercialização, mas sim com a fabricação, já que o prazo de validade não havia expirado e a caixa estava devidamente lacrada. Recomendaram que eu procurasseo Procon, mesmo eu insistindo que estava reclamando como cidadão preocupado com um problema de saúde pública, e não como um consumidor interessado em uma eventual reparação individual. Hoje é sexta e continuo mal.

Como disse outro dia, em um e-mail a amigos, "infelizmente, estamos nos acostumando com a tese de que é mais fácil fazer valer nossos direitos como consumidores do que como cidadãos, razão porque está mais fácil ver respeitado o Código de Defesa do Consumidor do que a Constituição Federal"

(Ah, Unilever. As fotos, sem qualquer manipulação, bem como a caixa e "corpos estranhos" estão em meu poder, à espera de uma resposta mais satisfatória do Poder Público)





Investimentos públicos em material escolar


                            Em 2012, 84 % dos estudantes do ensino básico do país estavam matriculados em escolas públicas

clique aqui para ouvir
Enquanto os pais de alunos da rede particular reclamam dos preços do material didático exigido pelas escolas de seus filhos, sobretudo dos livros, os governos federal, municipais e de alguns estados investem bilhões de reais para cumprir o que prevê a Constituição Federal e garantir material escolar gratuito aos estudantes das escolas públicas. Mesmo reconhecidos por pais de alunos da rede pública e por representantes do mercado editorial, os programas públicos de distribuição de livros e material escolar sofrem constantes denúncias e questionamentos.
No ano passado, somente o governo federal investiu mais de R$ 1 bilhão para garantir que os mais de 42 milhões de estudantes da rede pública de ensino básico do país recebam, gratuitamente, as obras didáticas que vão usar em salas de aula este ano. Neste ano, mais R$ 66 milhões deverão ser gastos na compra de obras literárias e técnico-científicas que vão ser distribuídas às bibliotecas da rede pública de ensino. Embora alta, a cifra é menor que os R$ 81 milhões que o Fundo Nacional de desenvolvimento da Educação (FNDE) informa ter investido no programa em 2012. Segundo a coordenadora-geral dos Programas do Livro do Fnde, Sônia Schawartz Coelho, isso não representa uma redução no total de livros comprados.
A estimativa do FNDE é de que, somados os programas nacionais do Livro Didático (PNLD) e Biblioteca da Escola (PNBE), cerca de 140 milhões de livros sejam distribuídos este ano em "regime de mútua cooperação" entre o fundo, as secretarias estaduais e municipais de educação e as escolas vinculadas ao programa.
Além dos livros, muitos estudantes recebem das prefeituras e de alguns governos estaduais parte do material escolar básico. Em São Bernardo do Campo (SP), por exemplo, a prefeitura promete investir R$ 20 milhões para garantir uniforme e material para 100 mil alunos das creches e do ensino infantil e fundamental da rede municipal. Os kits incluem cadernos, apontadores, giz de cera, borracha, jogo de canetas hidrográficas, régua, pastas com elástico, entre outros itens, além de dois conjuntos de uniforme escolar completos, incluindo meias e tênis.
"A distribuição do uniforme visa à inclusão social e à segurança dos alunos, já que na rede pública há muitos estudantes que não podem comprar esses itens. Segurança porque, com o uniforme, os alunos são mais facilmente identificados. Só que seria um absurdo a prefeitura [exigir isso] dos que não podem comprar", disse à Agência Brasil o secretário adjunto de Educação de São Bernardo do Campo, Rafael Cunha e Silva. Ele garantiu que, além de atender a todos os estudantes da rede municipal, a prefeitura compra material suficiente para eventuais necessidades ao longo do ano.
Santa Catarina é um dos estados cujo governo também promete distribuir material escolar para os alunos da rede pública estadual. Em 2013, vão ser investidos cerca de R$ 10 milhões para garantir que os mais de 550 mil alunos do ensino fundamental e médio recebam um kit com os itens básicos necessários em sala de aula.
De acordo com Censo Escolar da Educação Básica, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 84 % dos estudantes do ensino básico do país estavam matriculados em escolas públicas em 2012. As redes municipais respondiam por quase metade (46%) dos cerca de 42 milhões de matrículas em unidades públicas de ensino. As escolas estaduais atendiam a 37% desse total, enquanto a rede federal registrava 1% das matrículas.
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terça-feira, janeiro 15, 2013

Networking



Fiz faculdade pra´rticular, atendendo aos conselhos de gente mais `ixperta´ que yo.

Faltei à minha própria festa de formatura e saí à francesa com um diploma embaixo do braço. Talvez, por isso, eu deva dizer que fui reprovado no objetivo inicial de me bem-articular.

Embora tenha conhecido - de relance - futuros secretários-adjuntos, apresentadores, empresários, bigriders profissionais e um monte de gostosas, não me tornei amigo de ninguém que me aceite em seu gabinete ou escritório para um particular sem hora marcada.

Currículo pra arranjar um trabalhinho, deu, mas articular que é bom não articulei.

Restaram uns amigos assim meio gauches, também desarticulados e quase tão semifoscos quanto yo.

Aos dois, um abraço.

sábado, janeiro 12, 2013

Epopeia Candanga


Brasília

Já escrevi e volto a repetir: fosse nos Estados Unidos, Hollywood já teria produzido mais de uma dezena de filmes explorando a história da construção de Brasília sob todos os ângulos: um louvando o "empreendedorismo" de JK. Outro defendendo a "genialidade" de Niemeyer. Um demonstrando que a história tende a "relegar a segundo plano" a importância do arquiteto e urbanista Lúcio Costa;  e vários para contar a saga dos candangos, os trabalhadores vindos de outras regiões, cuja maioria, pobre, pôs a mão na massa e efetivamente construiu Brasília conforme projetada por um comunista para, no fim, ser expulsa para a periferia, que, aqui, recebe o nome de cidades-satélites. Haveria outros tantos remontando no melhor estilo Vidas Secas a aventura que foi "marchar para o Oeste" e "domar" o Cerrado inóspito. Talvez houvesse até produtor disposto a denunciar o quanto se desviou de dinheiro público ou então a forma como, pré-legislação ambiental, se destruiu de vegetação local. Não duvido sequer que houvesse quem gastasse celuloide (isso é só uma expressão, já que, agora, é tudo filmado digitalmente) para divagar sobre a dificuldade técnica de se criar um lago artificial de 48 quilômetros quadrados de extensão, o Lago Paranoá, para garantir o suprimento inicial de energia elétrica para a cidade, mas, principalmente, para aumentar a pouca umidade da região, sem o que seria praticamente inviável para quem viesse de fora (sim, porque cabe lembrar que, antes de Brasília, muita gente já vivia nas fazendas então existentes) viver aqui. 

Como (graças a Deus?) não somos norte-americanos e nosso cinema não se ocupa dessas histórias, resta a quem se interessar e puder pesquisar por sua própria conta em livros ou na internet. Ou torcer para que a sensacional exposição As Construções de Brasília, que resultou em um belíssimo e instigante livro de 240 páginas publicado pelo Instituto Moreira Salles, continue rodando o país e chegue a sua cidade. Eu a vi em São Paulo, mas acho que nem mesmo em Brasília o conjunto das valiosas fotos históricas de Marcel GautherotPeter Scheier e Thomaz Farkas foram exibidas. Em todo caso, quem entre meus três leitores tiver interesse, pode clicar aqui para ver parte das fotos, além de ouvir algumas das canções usadas na exposição.



    

No e Infâncias Clandestinas



Dois filmes em cartaz no Cine Liberty, em Brasília, lançam novos olhares sobre o velho tema das sangrentas ditaduras latino-americanas da segunda metade do século passado. E, por tabela, reforçam a tese de que, mesmo com poucos recursos, é possível fazer um excelente longa-metragem desde que se tenha um bom roteiro em mãos - enquanto o contrário só muito raramente acontece.

Indicado para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, No (do espanhol não) é o mais divertido, instigante e tecnicamente bem-resolvido dos dois. Dirigido por Pablo Larraín (do também ótimo e inusitado Tony Manero), é uma coprodução chilena, francesa e norte-americana baseado em uma obra do escritor chileno Antonio Skármeta (O Carteiro e o Poeta). Premiado no Festival de Cannes e estrelado por Gael Garcia Bernal, o filme trata do referendo convocado em 1988, pelo governo militar chileno, que tinha a a pretensão de, com o resultado das urnas, legitimar perante a opinião pública internacional o mandato do general Augusto Pinochet, que tomou o poder após um golpe de Estado, em 1973, eliminando violentamente parte dos que se opuseram ao seu governo. 

Descretentes de que o regime aceitasse uma eventual derrota e certos de que parte dos chilenos não teriam coragem ou interesse de votar pela destituição de Pinochet, líderes da oposição aceitam participar da campanha prévia ao referendo apenas para firmar posição e para aproveitar o espaço de rádio e tv para, dentro do possível, denunciar a violência institucional, a censura e a desigualdade então existente, mas que não podiam ser noticiadas. Para isso, apostam em um discurso carregado de ideologia, mas pouco atraente para as massas. Até que um jovem publicitário, interpretado por Gael, é convidado a opinar e acaba se engajando na campanha do Não a Pinochet e ao regime.  

É do choque e do resultado do trabalho conjunto desenvolvido pelo "comercial" e apartidário publicitário, os radicais de esquerda e os líderes pragmáticos que irrompe a força do filme e seu ineditismo. Destaque para o complexo papel de Gael, cuja personagem não é nem o salvador da pátria, nem um alienado político. Embora aposte todas suas fichas na capacidade de convencer os chilenos a votarem pela não permanência de Pinochet na presidência desde que usando as mesmas bem-sucedidas técnicas de marketing que emprega para vender refrigerantes, o jovem conhece muito bem as mazelas da ditadura: ele próprio teve que deixar o país e se exilar no México devido à resistência política de seu pai (que só é mencionado). Conflito que, a certa altura, Gael sugere com um olhar, quando sua personagem é obrigada a se separar do filho de quem cuida quase que sozinho. Nessa cena, fica a sugestão de que a tentativa de não tomar partido e permanecer alheio, brincando com o trenzinho do filho enquanto fatura alto servindo ao patrão governista, pode não passar de uma tentativa de escapismo.

E por falar no patrão, o dono da agência de publicidade, há entre os vários bons diálogos um que merece uma reflexão no caminho de volta para casa: a declaração do chefe - que, além da agência, comanda a campanha do sim à permanência de Pinochet no poder, representando além de uma publicidade que, embora ainda eficaz, começa a ficar ultrapassada, assim como o próprio regime militar e dos carcomidos, obsoletos e sisudos militares - discursa sobre a importância de associar a campanha do Não à anarquia, à violência e, principalmente, embora sem pronunciar a palavra, ao comunismo. Para, em seguida, destacar a segurança da manutenção do já estabelecido e do capitalismo, regime que "proporciona a qualquer um a chance de melhorar de vida. Mas atenção, a qualquer um. Não a todos". Segundo ele, é por causa da esperança de vir a ser este qualquer um que, no capitalismo, a maior parte das pessoas não se revoltam com as desigualdades, que aprendem a imaginar que só prejudicam aqueles que não se esforçam o baste para ser este "qualquer um".    

O outro filme é argentino. Dirigido por Benjamim Ávila, Infâncias Clandestinas aborda os efeitos da ditadura argentina, que durou de 1976 até 1983 e é considerada a mais sangrenta do período. Ao contrário dos muitos filmes argentinos que tratam do assunto, o longa também busca inovar ao optar por, ao invés de mirar o conflito a partir do ponto de vista dos adultos, envolvidos ou não com a resistência e com a luta armada, questionar quais os efeitos do exílio, da clandestinidade, do medo e da coragem para os filhos dos militantes de esquerda, crianças que não escolheram a vida que levam. 

Embora lembre muito o brasileiro O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburguer, se diferencia por colocar as crianças no centro da ação, em risco direto. Enquanto no primeiro o filho é deixado pelos pais guerrilheiros em suposta segurança, neste, as crianças seguem junto a família, ouvindo desde cedo que mais vale morrer lutando pela liberdade do que viver escravo de um sistema sanguinolento. 

terça-feira, janeiro 08, 2013

Leite Derramado


Desde que empaquei antes de chegar à metade do primeiro romance publicado por Chico Buarque, devidamente intitulado Estorvo (prêmio Jabuti de melhor romance de 1992, embora eu ache que foi o jornalista Paulo Francis quem disse que o livro era realmente um estorvo) nunca mais havia me interessado por ler qualquer outro livro escrito pelo genial compositor. Até ganhar um exemplar de Leite Derramado, lançado em 2009.

A história do idoso preso a uma cama de hospital que relembra episódios de vida misturados à saga da própria família, desde ancestrais fidalgos portugueses, passando por um barão, um senador, até chegar a um neto, garotão do Rio de Janeiro atual, é tão envolvente que me bastaram dois dias para dar conta das 195 páginas. 

Ou Chico aperfeiçoou-se como ficcionista ou eu, como  acho mais provável, tornei-me capaz de apreciar sua prosa. A ponto de estar pensando em me dar mais uma chance  de ler o Estorvo. (Pensei também em ler Budapeste, muito embora, como já escrevi aqui, a adaptação do livro para o cinema seja sofrível e afugente o neófito na obra literária de Chico)


"Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na raiz da serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental, não é por causa da morfina. Você vai dispor dos rendados, dos cristais, da baixela, das joias e do nome da minha família. Vai dar ordens aos criados, vai montar no cavalo da minha antiga mulher. E se na fazenda ainda não houver luz elétrica, providenciarei um gerador para você ver televisão. Vai ter também ar condicionado em todos os aposentos da sede, porque na baixada hoje em dia faz muito calor. Não sei se foi sempre assim, se meus antepassados suavam debaixo de tanta roupa. Minha mulher, sim, suava bastante, mas ela já era de uma nova geração e não tinha a austeridade da minha mãe.(clique aqui para ler todo o primeiro capítulo)"


terça-feira, janeiro 01, 2013

Passagem Salgada

parte de uma queima de fogos que, ao todo, durou mais de 15 minutos




Dane-se que está chovendo, há neblina, e, consequentemente, os já habituais congestionamentos nas estradas rumo ao litoral vão estar ainda mais infernais. Dane-se que meia São Paulo vai estar onde só caberia uma décima parte disso. Que vai haver filas nos mercados, padarias, restaurantes, sorveterias. Pouco importa que o trânsito esteja caótico e andar de ônibus se torne impossível dado o úmido calor senegalesco de 39º. Aliás, temporariamente, danem-se os escorchantes R$ 2.90 da passagem de ônibus mais barata. Danem-se o carros de portas abertas tocando alto gangnam style. Danem-se ainda mais os sertanejos. Danem-se os filmes dublados em cartaz nos cinemas. As cervejas a R$ 4 e a água de coco a R$ 3.5. Os banheiros infectos. Boa parte das praias impróprias. Gente besuntada de uma substância indefectível.

Dane-se.

Quando há ondas no dia 30 e você pode permanecer no mar, surfando, até perto das 20h30, quando já não é mais possível enxergar as ondas antes delas arrebentarem e a espuma branca avançar sobre você, tudo isso se torna irrelevante.

Após quase três horas pegando onda, você deixa o mar e volta pra casa exausto, com os braços pesados, o pescoço dolorido e a panturrilha parecendo que vai ceder ao peso do seu próprio corpo. A alma e a cabeça, contudo, vão leves, satisfeitas, realizadas. E enquanto caminha de volta pra casa chutando a água do mar, você agradece por este presente, este privilégio, de poder se despedir de um ótimo ano deslizando sobre as ondas. E mesmo sem querer abusar, pede aos céus que repitam a dose no dia 1º, afinal, que melhor forma de começar bem um ano novo que dentro do mar, surfando.