domingo, novembro 03, 2013

CAMUS E A REVOLTA QUE SE MANTÉM

Na semana em que comemora a reciclagem da turma de Caco Antibes pela Vênus platinada sem novas ideias, o mundo lembra os 100 anos do nascimento do escritor Albert Camus.
Nascido em 7 de novembro de 1913, na Argélia, então colônia francesa, o autor de O Estrangeiro, A Peste, O Mito de Sísifo, entre outros importantes romances, ensaios e peças de teatro é considerado um dos mais influentes intelectuais do século XX.

Não à toa, o filho de agricultores/operários recebeu, em 1957, aos 44 anos de idade, o Prêmio Nobel de Literatura. Uma distinção "pelo conjunto da obra que põe em destaque os problemas que se colocam em nossos dias à consciência do homem".

Camus morreu três anos depois de receber o Nobel, em um acidente de automóvel. (O absurdo do acaso, tema recorrente em sua obra, é que o escritor tinha em seu bolso uma passagem de trem de Sens para Paris. Desistira e alugara o carro em que morreria).

Após 53 anos de sua morte, a influência de Camus no ambiente intelectual ainda se faz sentir. Talvez porque as questões importantes à consciência humana se mantenham as mesmas. No Brasil, por exemplo, o ensaio O Homem Revoltado (1951) foi lembrado por muitos que analisam as manifestações populares que tomaram as ruas nos últimos meses.

Lembrança óbvia, já que no cerne de O Homem Revoltado se encontra "o problema mais cruciante da revolta, ou seja, a questão se existe alguma coisa que se possa fazer para melhorar este mundo de injustiça e sofrimento que não aumente a injustiça e o sofrimento?". Black Blocs?! 

Motivado pela efeméride, reli o romance O Estrangeiro. Escrito em meio a Segunda Guerra Mundial (1939/1945), quando Camus se dedicava ao jornalismo, o romance leva o leitor a identificar o absurdo da situação e do comportamento do protagonista, Meursault, um homem indiferente - ou insensível - às convenções sociais e às expectativas que os outros têm a seu respeito.

O problema é quando a aparente indiferença de Meursault - um aspecto, digamos, passivo, de sua personalidade -, que vai incomodar algumas das outras personsagens da história, se confunde à consciente resignação do protagonista diante de fatos contra os quais não tem poder algum.

"Hoje, minha mãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem". Reage Meursault diante do telegrama enviado do asilo para onde enviara a mãe. "`Sua mãe falecida. Enterro amanhã. Sentidos Pesâmes´. Isso não quer dizer nada. Talvez tenha sido ontem".

"...ao redor daquele asilo onde as vidas se apagavam, a noite era como uma trégua melancólica. Tão perto da morte, mamãe deve ter-se sentido liberada e pronta a reviver tudo. Ninguém, ninguém tinha o direito de chorar por ela. Também eu me senti pronto a reviver tudo. Como se esta grande cólera me tivesse purificado do mal, esvaziado de esperança, diante desta noite carregada de sinais de estrelas, eu me abria pela primeira vez à terna indiferença do mundo. Por senti-lo tão parecido comigo, tão fraternal, enfim, senti que tinha sido feliz e que ainda o era. Para que tudo se consumasse, para que me sentisse menos só, faltava-me desejar que houvesse muitos espectadores no dia da minha execução e que me recebessem com gritos de ódio".

O Estrangeiro é um livro que se lê de um único fôlego e ao qual dificilmente ficamos indiferentes. Agora, vou para as ruas atrás do Homem Revoltado, mas com cuidado para não contribuir para tornar este mundo ainda mais injusto.