terça-feira, maio 13, 2008

Terça-feira, 13 de maio de 2008



Uma das poucas pessoas coerentes do atual governo, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, acaba de renunciar ao seu cargo. A iniciativa de Marina causou enorme alvoroço, não só em Brasília, mas em todos os veículos de comunicação. E, com certeza, ainda irá repercutir mundo afora.

domingo, maio 11, 2008

Santa Cruz de la Sierra, 07 de maio de 2008

(I) Consulta popular sobre autonomia de Santa Cruz opõe nascidos no estado mais rico da Bolívia e migrantes que buscam melhores oportunidades de vida

fotos: Marcello Casal / Agência Brasil

À frente do movimento autonomista que ganhou forças após a chegada, em 2006, do índio aimara Evo Morales à presidência da Bolívia, Santa Cruz foi a primeira província (estado) boliviana a consultar sua população a respeito do estatuto autonômico que grupos de oposição ao governo federal pretendem ver implementado.

Em toda Santa Cruz, a votação ocorreu no dia 4 de maio. Outros três dos nove estados bolivianos também já agendaram as datas para realizar semelhantes consultas. Em Pando e Beni a votação está prevista para ocorrer no próximo 1 de junho. Já em Tarija, a consulta deverá acontecer no dia 22 do mesmo mês.

Na prática, os estatutos autonômicos são espécies de Constituições estaduais que, em vigor, delegariam mais poderes aos governantes locais, hoje, resumidos nas figuras dos prefeitos (governadores) e alcaides (algo como os sub-prefeitos de algumas capitais brasileiras).

Em Santa Cruz, 85,5% dos votos válidos aprovaram a autonomia. Ocorre que, segundo a própria Corte Departamental Eleitoral de Santa Cruz (responsável por organizar a consulta a pedido do prefeito de Santa Cruz, Rubén Costas, sem o aval do Conselho Nacional Eleitoral, que declarou a iniciativa inconstitucional), enquanto 14,4% dos eleitores habilitados votaram contra o estatuto autonômico, o índice de abstenção chegou a 37,9%.

Como tinham estimulado os cruzenhos a não comparecerem às urnas para que não validassem uma consulta que não fora convocada pelo Congresso Nacional e que organismos internacionais como a Organização dos Estados Americanos (OEA) não reconheciam como legítima, os líderes da campanha contra as mudanças contabilizam os quase 38% de ausentes aos que rechaçaram o estatuto autonômico votando pelo “não”. Com o resultado, sustentam o que Morales classificou como “um fracasso rotundo” da campanha autonomista. Juntos, os votos no não e abstenções totalizam 52,4% dos votos.

De qualquer forma, os números só comprovaram a divisão da sociedade cruzenha, o que, por sua vez, seria um indício do que está ocorrendo em maior ou menor grau em toda a Bolívia.

Em Santa Cruz, os que votaram a favor da proposta de autonomia criticam o que classificam como excessivo poder de La Paz, capital do país. Em sua quase totalidade, se opõem ao governo de Morales e às mudanças estruturais que este propõem, como a reforma agrária. Alegam ser favoráveis à descentralização das decisões políticas e econômicas como forma de permitir que os estados decidam onde e como investir os recursos a que têm direito.

Para os que se opõem ao estatuto, a iniciativa visa desestabilizar o governo de Morales e significa, na prática, uma quase declaração de independência. À frente deste grupo estão os chamados “massistas”, integrantes ou simpatizantes do partido de Morales, Movimento ao Socialismo (MAS).

Estes afirmam que os estados não podem assumir a competência exclusiva por temas como educação, saúde, segurança pública e até a prerrogativa de aprovar convênios internacionais. O ponto mais controverso, no entanto, é a possibilidade de os governantes estaduais administrarem os recursos naturais existentes em seus territórios e a propriedade da terra, estabelecendo o tamanho, características e parâmetros de cumprimento das funções econômica e social da terra.

Um dos líderes do movimento pró-autonomia, o fazendeiro Branco Marinkovic negou a intenção de separar Santa Cruz do restante do país e de enfraquecer politicamente a Morales. “Este nunca foi um movimento pela independência do estado. E não tem nada que ver com o governo de Morales. Este é um processo de muitos anos e que chegou ao seu ápice agora, mas que poderia acontecer com qualquer outro presidente”.


Possível candidato da oposição à Presidência da Bolívia e presidente do Comitê Pró-Santa Cruz, Marinkovic está entre os homens mais ricos do país. Ele diz a verdade quando alega que o movimento pela autonomia dos estados vem de longa data. Razão pela qual os próprios massistas defendem a autonomia. Para eles, no entanto, essa não deve servir para reforçar o poder amealhado pelas elites tradicionais. Nos panfletos que distribuía para convencer as pessoas a não votarem pela autonomia defendida pelo Comitê Pró-Santa Cruz e pelo governador, o grupo defendia a “autonomia legal e para todos”, sugerindo que somente a promulgação da nova Constituição tornará isso possível.

quinta-feira, maio 08, 2008

Santa Cruz de la Sierra, 04 de maio de 2008


(II) Quando "collas" e "cambas" se enfrentam por uma suposta autonomia
Infelizmente, a cisão política acabou por estimular diferenças étnicas e sociais entre a população de Santa Cruz. Desde a véspera da consulta, o ânimo se acirrou em algumas localidades e simpatizantes de ambas as propostas chegaram às vias de fato. No domingo (4), as ruas do bairro popular Plan Tres Mil, a sete quilômetros do centro da capital do estado, Santa Cruz de la Sierra, se tornou um campo de batalha onde massistas e favoráveis à autonomia, sobretudo da União Juvenil Cruzenha, se enfrentavam armados com paus, pedras, rojões e até estilingues.

Para um estrangeiro, era difícil distinguir quem era quem em meio à correria. Ao mesmo tempo, era impossível ficar alheio ao ódio que punha em campos opostos os chamados “collas” e “cambas”.
fotos: Alex Rodrigues
Collas é como são pejorativamente chamados as pessoas de outras regiões que se mudaram para Santa Cruz em busca de melhores condições de vida. Vêm sobretudo de estados como La Paz, Sucre e Chuquisaca. Já os cambas são os nascidos em Santa Cruz, o estado mais rico do país, próspero em petróleo, gás natural e em plantações de soja.

Para o cientista político Alfonzo Román, essa rixa entre os dois grupos foi determinante para o resultado da consulta. Román criticou os líderes sociais que, segundo ele, estimularam o ódio para conquistarem votos. “Diante da incapacidade de apresentarem propostas ideológicas, uma nova filosofia de Estado, tomaram como bandeira as diferenças culturais, raciais, étnicas e sociais”, afirmou Román, responsabilizando governo e oposição pela divisão “do país, das cidades, das regiões, dos povos. Os resultados também são reflexo de uma luta de classes, devido à diferenças culturais e de pontos de vista”.

Para o cientista, o estatuto autonômico de Santa Cruz não é aplicável. Román entende que os líderes pró-autonomia desejam apenas acumular influência política para pressionar o governo federal a negociar reivindicações dos estados e da oposição. “Este documento é uma mistura de autonomia, federalismo e separatismo. Até mesmo os líderes do movimento pró-autonomia estão convencidos de que ele não poderá ser implementado a menos que se declare a independência do estado”.

O cientista, no entanto, teme pelo acirramento da disputa. “A menos que as pessoas que estão à frente dessa confrontação tenham nobreza para sentar e negociar um projeto de Constituição que aglutine todos os setores do país, vamos terminar em uma confrontação.”
Na mesma noite da consulta, Morales convidou os governadores de todo o país a trabalharem por uma “real autonomia”, auxiliando-o a aprovar o novo texto constitucional. “Que meu chamado seja ouvido a fim de garantirmos a verdadeira autonomia para todo o povo, não apenas para alguns grupos”, disse Morales durante pronunciamento em rede nacional.

Aparentemente alheio às implicações de seu gesto, o Senado boliviano aprovou na noite da quarta-feira (7) uma resolução que reconhece os resultados da consulta cruzenha. Sem a participação dos parlamentares governistas, que se retiraram da sessão, a oposição declarou que “a legítima vontade e atitude demonstrada pelos cidadãos cruzenhos em todo o departamento deu um sinal inequívoco à Bolívia de unidade e de sua vocação democrática”, isso apesar dos questionamentos legais, da estrutura mambembe em que transcorreu a consulta e de todas as brigas.Só para se ter uma idéia, os votos eram contados manualmente, em blocos, pelos próprios mesários, que abriam as urnas dentro de salas onde não havia a presença de qualquer pessoa contrária à autonomia. Os votos iam sendo contabilizados de forma rudimentar, anotados em lousas e os ditos observadores internacionais eram pessoas convidadas pela Corte Departamental de Santa Cruz e integravam organismos como o Partido Cristão Cubano com sede em Miami (EUA).
Neste domingo (11), a Agência Boliviana de Informações divulgou que Morales irá promulgar amanhã (12) a Lei de Referendo Revogatório de seu próprio mandato, bem como dos de seu vice e dos nove governadores. Com isso, dentro de 90 dias, ou seja, 10 de agosto, a população de toda a Bolívia voltará às urnas a fim de responder a) se está de acordo com a continuidade do processo de mudanças liderado por Morales e pelo vice-presidente, Álvaro García Linera; b) se está de acordo com a continuidade das políticas, ações e gestão do governador de seu estado.

O projeto de lei havia sido apresentada por Morales em dezembro de 2007 à Câmara dos Deputados, que o aprovou há quatro meses. Na última quinta-feira (8), o Senado o sancionou.

Para o vice-ministro de Coordenação Governamental, Héctor Arce, a iniciativa vai muito além do referendo revogatório originalmente sugerido pelo próprio Morales, já que os bolivianos irão avaliar as propostas, programas e ações de seus governantes. Para Arce, diante disso, não há qualquer sentido na realização das consultas sobre a autonomia de Pando, Beni e Tarija. “Estas são consultas que ao invés de fazer bem a autonomia lhe estão causando um tremendo dano. Essas consultas estão à margem da lei e alguém vai ter de se responsabilizar”.