quinta-feira, maio 08, 2008

Santa Cruz de la Sierra, 04 de maio de 2008


(II) Quando "collas" e "cambas" se enfrentam por uma suposta autonomia
Infelizmente, a cisão política acabou por estimular diferenças étnicas e sociais entre a população de Santa Cruz. Desde a véspera da consulta, o ânimo se acirrou em algumas localidades e simpatizantes de ambas as propostas chegaram às vias de fato. No domingo (4), as ruas do bairro popular Plan Tres Mil, a sete quilômetros do centro da capital do estado, Santa Cruz de la Sierra, se tornou um campo de batalha onde massistas e favoráveis à autonomia, sobretudo da União Juvenil Cruzenha, se enfrentavam armados com paus, pedras, rojões e até estilingues.

Para um estrangeiro, era difícil distinguir quem era quem em meio à correria. Ao mesmo tempo, era impossível ficar alheio ao ódio que punha em campos opostos os chamados “collas” e “cambas”.
fotos: Alex Rodrigues
Collas é como são pejorativamente chamados as pessoas de outras regiões que se mudaram para Santa Cruz em busca de melhores condições de vida. Vêm sobretudo de estados como La Paz, Sucre e Chuquisaca. Já os cambas são os nascidos em Santa Cruz, o estado mais rico do país, próspero em petróleo, gás natural e em plantações de soja.

Para o cientista político Alfonzo Román, essa rixa entre os dois grupos foi determinante para o resultado da consulta. Román criticou os líderes sociais que, segundo ele, estimularam o ódio para conquistarem votos. “Diante da incapacidade de apresentarem propostas ideológicas, uma nova filosofia de Estado, tomaram como bandeira as diferenças culturais, raciais, étnicas e sociais”, afirmou Román, responsabilizando governo e oposição pela divisão “do país, das cidades, das regiões, dos povos. Os resultados também são reflexo de uma luta de classes, devido à diferenças culturais e de pontos de vista”.

Para o cientista, o estatuto autonômico de Santa Cruz não é aplicável. Román entende que os líderes pró-autonomia desejam apenas acumular influência política para pressionar o governo federal a negociar reivindicações dos estados e da oposição. “Este documento é uma mistura de autonomia, federalismo e separatismo. Até mesmo os líderes do movimento pró-autonomia estão convencidos de que ele não poderá ser implementado a menos que se declare a independência do estado”.

O cientista, no entanto, teme pelo acirramento da disputa. “A menos que as pessoas que estão à frente dessa confrontação tenham nobreza para sentar e negociar um projeto de Constituição que aglutine todos os setores do país, vamos terminar em uma confrontação.”
Na mesma noite da consulta, Morales convidou os governadores de todo o país a trabalharem por uma “real autonomia”, auxiliando-o a aprovar o novo texto constitucional. “Que meu chamado seja ouvido a fim de garantirmos a verdadeira autonomia para todo o povo, não apenas para alguns grupos”, disse Morales durante pronunciamento em rede nacional.

Aparentemente alheio às implicações de seu gesto, o Senado boliviano aprovou na noite da quarta-feira (7) uma resolução que reconhece os resultados da consulta cruzenha. Sem a participação dos parlamentares governistas, que se retiraram da sessão, a oposição declarou que “a legítima vontade e atitude demonstrada pelos cidadãos cruzenhos em todo o departamento deu um sinal inequívoco à Bolívia de unidade e de sua vocação democrática”, isso apesar dos questionamentos legais, da estrutura mambembe em que transcorreu a consulta e de todas as brigas.Só para se ter uma idéia, os votos eram contados manualmente, em blocos, pelos próprios mesários, que abriam as urnas dentro de salas onde não havia a presença de qualquer pessoa contrária à autonomia. Os votos iam sendo contabilizados de forma rudimentar, anotados em lousas e os ditos observadores internacionais eram pessoas convidadas pela Corte Departamental de Santa Cruz e integravam organismos como o Partido Cristão Cubano com sede em Miami (EUA).
Neste domingo (11), a Agência Boliviana de Informações divulgou que Morales irá promulgar amanhã (12) a Lei de Referendo Revogatório de seu próprio mandato, bem como dos de seu vice e dos nove governadores. Com isso, dentro de 90 dias, ou seja, 10 de agosto, a população de toda a Bolívia voltará às urnas a fim de responder a) se está de acordo com a continuidade do processo de mudanças liderado por Morales e pelo vice-presidente, Álvaro García Linera; b) se está de acordo com a continuidade das políticas, ações e gestão do governador de seu estado.

O projeto de lei havia sido apresentada por Morales em dezembro de 2007 à Câmara dos Deputados, que o aprovou há quatro meses. Na última quinta-feira (8), o Senado o sancionou.

Para o vice-ministro de Coordenação Governamental, Héctor Arce, a iniciativa vai muito além do referendo revogatório originalmente sugerido pelo próprio Morales, já que os bolivianos irão avaliar as propostas, programas e ações de seus governantes. Para Arce, diante disso, não há qualquer sentido na realização das consultas sobre a autonomia de Pando, Beni e Tarija. “Estas são consultas que ao invés de fazer bem a autonomia lhe estão causando um tremendo dano. Essas consultas estão à margem da lei e alguém vai ter de se responsabilizar”.

2 comentários:

Lidia disse...

Preguiça de escrever, é?

Anônimo disse...

Acho que vou ficar com Serra Negra mesmo....rsrs