domingo, novembro 02, 2008

Atores de Macapá lutam para atrair público e fazer teatro de qualidade

Macapá - Distantes das Regiões Sul e Sudeste, onde se concentram a maior parte da produção teatral brasileira e os principais agentes incentivadores das artes, atores macapaenses lutam contra as adversidades para fazer teatro de qualidade na “Capital do Meio do Mundo”. Embora o número de jovens interessados em teatro cresça ano a ano, Macapá ainda não conta com um único curso de graduação em artes cênicas. A falta de espaços para ensaiar e se apresentar é outro dos problemas enfrentados pelos interessados em montar um espetáculo.

Além disso, se quiserem assistir a qualquer peça de algum importante grupo teatral, os macapaenses têm que viajar para outros estados. “Nunca tivemos a oportunidade de assistir a um José Celso Martinez Corrêa, a um Antunes Filho ou a um Gerald Thomas. O que vêm são os grupos globais, um teatro de riso fácil e que tem platéia certa. Poucos grupos de teatro contemporâneo vêm a Macapá”, reclama o ator Paulo Alfaia, dizendo que a exceção são as companhias e atores que viajam o país como atração do Palco Giratório, um projeto do Serviço Social do Comércio (Sesc).

Atualmente, os mais de 300 mil moradores da capital dispõem de apenas dois espaços cênicos. Um é o Teatro das Bacabeiras. Além dos 705 lugares na platéia, o teatro conta com salas secundárias projetadas para abrigar oficinas e os ensaios de espetáculos. Boa parte dos eventos oficiais realizados em Macapá ocorre no Bacabeiras, que também é disputado por empresas interessadas em promover eventos.

O outro local destinado às encenações teatrais é o chamado Teatro Porão do Sesc Araxá. “Isso aqui era um depósito de lixo e nós decidimos transformá-lo num teatro de arena improvisado”, explica Alfaia. Além de atuar, ele dirige a única peça teatral (Bent, escrito pelo dramaturgo norte-americano Martin Sherman, retrata à perseguição nazista aos homossexuais na Alemanha da década de 1930) em cartaz durante a semana em que a reportagem da Agência Brasil passou na cidade.

Envolvido com teatro há mais de 20 anos, Alfaia diz que há poucos exemplos de atores que vivem exclusivamente das artes cênicas na cidade. Segundo ele, é muito difícil atrair o público, ainda pouco acostumado com o teatro. “É muito difícil viver de arte em Macapá. Todo o elenco tem outras atividades e a única instituição que nos dá apoio é o Sesc [Serviço Social do Comércio]. Buscamos apoio de políticos, de universidades, mas acabamos tendo que tirar dinheiro de nosso próprio bolso para produzir o trabalho da forma que queremos”, queixa-se.

Diretora-adjunta do Centro de Educação Profissional de Artes Visuais Cândido Portinari, unidade de ensino mantida pelo governo estadual e única a oferecer um curso gratuito para os interessados em se iniciar no teatro, Rosana Olívia Souza aponta duas razões principais para as dificuldades do teatro macapaense.

“Falta apoio dos empresários. Eles poderiam investir e apoiar o que é feito na cidade”, diz Rosana. “Além disso, as pessoas aqui não estão habituadas a valorizar nossos artistas, a pagar para assistir a um espetáculo teatral local. Temos peças de qualidade, mas nem mesmo as de maior sucesso local conseguem sobreviver apenas da bilheteria”, assinala a diretora.

Segundo Rosana, entre crianças, jovens e adultos, a Cândido Portinari atende cerca de 40 estudantes de teatro. O centro profissionalizante também mantém cursos de artesanato e de artes plásticas. Esse último, informa Rosana, também beneficia as artes cênicas, já que capacita profissionais que poderão trabalhar com a confecção de cenários e figurinos. “Precisamos que as pessoas vejam nas artes não apenas uma forma de entretenimento, mas também uma profissão”.

Para Alfaia, no entanto, atrair o público macapaense exige peças bem feitas e diversificadas, o que exige investimentos públicos e privados nos grupos e atores. “Temos que nos preocupar com a formação de platéia. Não dá para dizer que o macapaense não tem o hábito de ir ao teatro, porque ele só passará a frequentar um se houver uma produção cultural local. Para isso, precisamos de incentivo”, defende o ator, que diz já ter encenado peças para apenas duas pessoas, mas reconhece o esforço da Secretaria Estadual de Cultura.

“Mesmo assim, acho que é mais difícil fazer teatro em Macapá que no restante do país. Nas Regiões Sul e Sudeste, as instituições dão mais apoio às artes. Não apenas as instituições governamentais, mas também os empresários, por meio da Lei Rouanet. Aqui esse apoio não chega. Que eu saiba não há qualquer grupo beneficiado com a Rouanet”, diz Alfaia, que foi um dos ganhadores do Prêmio Funarte de Teatro Myriam Muniz, com um espetáculo de outro grupo. A peça, segundo ele, ironizava o consumismo exacerbado.

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