Assunto : De Argentina (4)
Para : semifosco semifosco@blogspot.com
16 de setembro de 2009 14:25
"Amigo semifosco, sei que o tema não é familiar para você, mas estou te levando mais uma lembrancinha que embora esteja exposta em qualquer banca de jornal portenha, parece não receber muita atenção dos turistas: uma revista inteiramente dedicada à "cultura cannabica".
Como muitos sabem, há cerca de um mês a Suprema Corte de Justiça da Argentina declarou inconstitucional que pessoas sejam punidas quando pegas portando pequenas quantidades de maconha. Isso não significa que o fumacê nas ruas esteja liberado ou que o consumo tenha sido descriminalizado, mas sim que um adulto pode queimar unzinho desde que esteja em ambientes privados e que seu gesto não ponha em risco a outras pessoas. Não parece ter ficado claro a que riscos os magistrados se referem.
Na América Latina, Colômbia e México já descriminalizaram o porte de pequenas quantidades de drogas enquanto o Brasil e o Equador estudam a possibilidade de legalizar o uso de algumas substâncias hoje consideradas ilícitas.
Na Argentina, ao que me parece, a revista THC tem importante papel para tal decisão. Criada há três anos com o intuito de lutar contra a ingerência do Estado sobre as liberdades individuais e informar sobre os direitos pessoais de usuários de drogas, a publicação defende o consumo responsável e a legalização da maconha. E, pelo que pude constatar, o faz de forma bem feita, justificando a real liberdade de imprensa.
Dá para sacar pela qualidade das reportagens que não se trata de um bando de malucos desmiolados defendendo o direito de cada um ficar doidão usando o que bem entender (embora, implicitamente, também o façam, de forma bem-humorada). Há entrevistas com juízes, promotores, consumidores e gente que cultiva sua própria planta, em casa. E o mais engraçado, não faltam anúncios publicitários de uma infinidade de produtos que vão desde seda (ou smokingpapers) à lâmpadas especiais para estufas, roupas e acessórios feitos com a fibra do cânhamo, livros e até torneios para escolha da melhor espécie.
Do exemplar que estou te levando, duas reportagens me chamaram a atenção. Uma sobre os golpes aplicados através da internet em pessoas iludidas por anúncios de produtos e sementes para o cultivo e que, após constatarem o engodo e o prejuízo, não podem recorrer à Justiça, o que permite que os mesmos estelionatários continuem enganando outras pessoas e a matéria "A Cadeia Alimentária", em que se afirma que os casos de extorsão, tortura, violações e mortes superam os supostos quilos de drogas apreendidas e incineradas.
De acordo com a matéria, em meados da década de 1990, quase que diariamente os jornais argentinos publicavam notícias sobre a prisão de supostos traficantes que, depois, como se veio a saber, tinham em comum o fato de serem mendigos, pacientes psiquiátricos, vendedores ambulantes ou estrangeiros ilegais. Diz a revista que o material supostamente apreendido era apresentado aos jornalistas durante concorridas entrevistas coletivas, mas que ao ser analisado em laboratório, era descartado por se tratar de substância inócua (erva mate, bicabornato de sódio, etc) ou impura. A reportagem conclui que toda a encenação era montada a fim de favorecer policiais carreiristas, que galgaram degraus na carreira às custas de inocentes.
Os editores da THC comemoraram a decisão da Suprema Corte, mas alertam que ainda há muito o que fazer para evitar que isso continue ocorrendo.
"O proibicionismo argentino se agarra a seus último estertor, a lei antidrogas menemista [do ex-presidente Carlos Meném] cujo rotundo fracasso está tão evidente que já perdeu sua legitimidade, se alguma vez a teve. Hoje, somos nós, os consumidores, acima de todas as coisas, que fazemos tal lei agonizar. Porque mesmo com os vexames a que nos submetem, perdemos o medo de sermos castigados por um delito que não cometemos e que cedo ou tarde deixará de existir", argumentam os editores.
"O proibicionismo argentino se agarra a seus último estertor, a lei antidrogas menemista [do ex-presidente Carlos Meném] cujo rotundo fracasso está tão evidente que já perdeu sua legitimidade, se alguma vez a teve. Hoje, somos nós, os consumidores, acima de todas as coisas, que fazemos tal lei agonizar. Porque mesmo com os vexames a que nos submetem, perdemos o medo de sermos castigados por um delito que não cometemos e que cedo ou tarde deixará de existir", argumentam os editores.
"Talvez faça falta mostrar como milhares de pessoas presas nas ruas ou em suas próprias casas por conta desta lei são torturados, violentados e até mesmo assassinados antes de serem processados, julgados e encarcerados, deixando de ser consumidores de algo que afetaria apenas a sí próprios para serem considerados culpados e se converterem em vítimas do aparato policial e judicial".
Nenhum comentário:
Postar um comentário