segunda-feira, agosto 27, 2012

Vandalismo não tem sexo


Creio que alguém precisa explicar as muito criativas meninas do movimento que os capitalistas, além de curtirem sexo anal,  adoram faturar em cima da venda de latas de spray e, posteriormente, dos galões de tinta necessários para o governo  repintar o que acaba de ser reformado às custas de muito dinheiro público.

Falando sério, o que mais me espantou na equivocada ação do movimento é que o abandono e a falta de segurança nas passarelas de pedestres do Eixão motivam alguns dos maiores pavores das brasilienses que não dispõem de carro. Por isso considero a pixação da passarela subterrânea da 203/103 Norte uma tremenda bola fora das meninas.   
                                          

Simpático ao movimento, que reúne algumas meninas muito criativas e inteligentes, me neguei a acreditar que  elas agissem de forma tão equivocada. Fui pesquisar na internet e acabei encontrando, no site do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), um texto em que a Associação Lésbica Feminista de Brasília (Coturno de Vênus) explica o que as levou a depredar - ou se apropriar, conforme diz o texto - da passagem subterrânea recém-reformada no início da Asa Norte.

Reproduzo parte do texto abaixo, tomando a liberdade de editá-lo a meu critério de forma a encurtá-lo e aproveitar apenas a parte que me interessa, que é a discussão quanto à apropriação do espaço público. Concordo com a tese, mas discordo dos meios. Penso se não haveria uma forma mais eficaz, criativa e, principalmente, produtiva de reclamar o direito ao "corpo-cidade"? Por exemplo? `Adotando´ uma passagem como forma de denunciar que seu abandono é um risco à população, sobretudo à integridade física das mulheres. Se pintar as paredes e instalar uma nova iluminação (velho anseio de uma grande parcela dos brasilienses, entre eles, eu) não é o bastante para garantir "segurança efetiva" aos pedestres, não será voltando a pixar tudo que isso será alcançado. E se não nos apropriarmos de fato destas passagens, as mulheres continuarão sendo as maiores vítimas em potencial da criminalidade. Se quiser ler a íntegra do texto do Coturno de Vênus, clique aqui

Da mesma forma que o movimento feminista reivindica o direito ao corpo, as intervenções urbanas reivindicam o direito à cidade. Os grafites, pixações, stickers, stencils, bombs e frases postas nos muros, cantos e passagens subterrâneas são assinaturas de um direito ao corpo de uma cidade silenciada pelo medo. E levantam uma série de protestos e indignações porque mostram aquilo que não pode ser dito, aquilo que incomoda, mas está vivo em nosso cotidiano. Para além de uma manifestação legítima de pensamentos e reflexões, são discursos não-oficiais - lê-se alternativas - da cidade na medida em que as pessoas começam a se apropriar do local.
É por isso que durante as atividades do mês da visibilidade lésbica, em agosto, a 8ª Ação Lésbica DF organizou um Sarau/Ocupação noturno na passagem subterrânea da 203 norte. No dia seguinte, recebemos várias críticas – algumas inclusive bastante violentas – sobre nossa ação direta nos muros brancos da passagem. Na ditadura, a pichação era utilizada como forma de protestar contra a repressão. Superado esse período de ditadura militar, hoje em dia, infelizmente, ainda vivemos em meio a uma série de ditaduras que nos controlam e nos oprimem, como a ditadura do machismo atrelada à heteronormatividade.
Entendemos que a ocupação da passagem subterrânea foi um espaço de liberdade para muitas das meninas que lá estavam. Fizemos uso do corpo da cidade como um meio de comunicação, expressão de sentimentos, pensamentos e opiniões das pessoas que passaram por lá. Ocupamos a cidade para nos apropriamos do nosso direito ao corpo, por meio do qual nos comunicamos e afirmamos nossas reivindicações.
As frases escritas nas paredes da passagem denunciam gritos abafados pela cidade e pelo preconceito à emancipação feminina. A [recente] tinta branca renovando as passagens subterrâneas que sempre foram conhecidas pelas inúmeras artes urbanas parece uma atitude repressora, que apaga as marcas da cidade, apagando também sua história. Uma ideia de falsa melhoria, de que “pintou, tá novo”. As novas luzes instaladas nas passagens são bonitas, mas daí a dizer que isso é segurança efetiva é um discurso um tanto quanto frágil, e sem dúvida, insuficiente para o enfrentamento da violência.
As críticas recebidas a partir de nossa ocupação, e divulgação da mesma - porque afinal as intervenções são para serem vistas e compartilhadas, e não escondidas como um crime - reforçam a ideia conservadora de que Brasília é uma cidade-museu, abandonada, e que não recebe pensamentos e influências das pessoas que ocupam a cidade, que querem manifestar e compartilhar seus desejos e artes.
Nesse sentido, acreditamos que nossas frases feministas possuem um caráter pedagógico e que quem ali passa e as lê poderá - quem sabe? - refletir e talvez até abrir sua cabeça para o fato de que, “sim, nós sofremos violências constantes do machismo nosso de cada dia”, e "sim, nós queremos viver livres de toda forma de opressão”.
Quanto ao fato de que algumas frases e intervenções são fortes e chocantes, sim, “elas são mesmo e não nos desculpamos por isso”. Para combater a opressão, precisamos externalizar e publicizar as violências sofridas, chocar a sociedade e provocar o debate, pressionando para que nossas ações se traduzam em políticas publicas que garantam melhoria para a vida das mulheres.
O feminismo precisa de gritos e é necessário se impor. Se não é dado o espaço para nós, nós é que iremos ocupar a rua e dizer o que não é dito em lugar nenhum. E o que é importante para nós. E o que queremos.
Queremos reconhecer além de nossos corpos, os nossos lugares de passagem. Disseminar a desconhecidas passantes das passagens, um possível grito de libertação. Claro, que a sociedade pode achar isso um tanto quanto perigoso – e é, uma revolução que cansou de ser silenciosa. 
Assim, construimos a 8ª Ação Lésbica do Distrito Federal, com a proposta de compartilhar momentos de intervenção político-social, cultural e de lazer, objetivando informar nossa comunidade e a sociedade de uma forma geral sobre problemas que afetam diretamente a vida de lésbicas e mulheres bissexuais e que podem ser minimizados a partir de uma postura mais flexível e hábil ao dialogo e a formação política. A ação aconteceu no último dia 26, com o tema Lei Maria da Penha Para Todas, com o intuito de divulgar informações sobre a lei – que neste ano comemora seis anos de atuação - e ampliar a sua abrangência para todas as mulheres. 




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