Por que as decisões corporativas não fazem sentido para quem vive sujeito à burocracia e, principalmente, aos preços impostos pelas empresas e prestadores de serviços?
Veja o caso do setor aéreo? Você sabe quanto seria o valor justo de uma passagem? Se optar por pegar um ônibus interestadual, R$ 50 a mais ou a menos serão facilmente contabilizados como uma boa ou má opção, não? Já no caso das passagens aéreas isso não acontece e não há parâmetros que nos permitam saber, com segurança, se estamos pagando muito ou pouco. Se as promoções de fato são promoções ou se, ao contrário, é no restante do tempo que as companhias estão nos tungando.
Meu amigo brasiliense Carlos Leite, um surfista beatnick que vive a vida a rodar, anda pesquisando passagens para a Venezuela, a pouco mais de 5 horas de São Paulo. Partindo da capital paulista no início de julho, a opção mais em conta sai a salgados R$ 2.189. Antes de pousar em Caracas, o voo segue até o Panamá. Só então a aeronave retorna ao destino desejado por meu amigo, onde chega 10h15 depois de partir de Guarulhos.
Leite não entendeu a lógica, mas concluiu que se descesse no Panamá ao invés de voltar a Caracas consumindo mais combustível, alimentos, trabalho-hora da tripulação e usando o banheiro, pagaria menos pela passagem. Ledo engano. Embora fosse passar apenas 6h57 a bordo de uma aeronave da mesma companhia, gastaria R$ 2.398. Ou seja, quase R$ 210 a mais para voar 3h15 a menos. A pesquisa, de toda forma, acabou tendo alguma serventia: Leite aprendeu que, caso decida conhecer o Canal do Panamá, o melhor a fazer é comprar uma passagem para Caracas e, durante a escala, simular um mal estar que o impeça de seguir viagem, forçando a empresa a desembarcar sua bagagem. Depois, é só ficar por lá mesmo.
Por curiosidade, Leite decidiu checar os preços das passagens para Bogotá, na Colômbia. Imaginando uma linha reta, a diferença das distâncias de São Paulo à capital colombiana ou à capital venezuelana (ou seria bolivariana?) não são assim tão grandes. Pelo menos não no mundo real. Já no mundo corporativo, a diferença deve ser significativa a ponto de justificar que uma outra empresa aérea ofereça passagens a R$ 1.279. O custo da economia? Passar 11 horas em Lima, Peru, gastando 21 horas para percorrer uma distância que exigiria apenas 6 horas.
Leite teve ainda uma última ideia. E se ele fosse pra Manaus de ônibus e, de lá, pegasse um voo para Bogotá, que fica ali do lado? Bom, aí, ao invés de R$ 1.279, ele pagaria, à mesma companhia, R$ 1.837. Mas ao invés de perder 21 horas, gastaria apenas 15 horas. "Quinze?!?!?!", se espantarão meus três leitores. Sim, 15 horas. Porque, ao invés de ser despachado direto para Bogotá, cruzando a Amazônia, Leite passaria quase cinco horas a bordo do avião voando para.... São Paulo, onde permaneceria por quase seis horas até, enfim, embarcar com destino a Bogotá, voltando a passar por...Manaus.
Sentindo que alguém brincava com seu bom senso, Leite me ligou para compartilhar suas dúvidas quanto à honestidade ou bom senso dos burocratas das empresas aéreas. Disse que está a ponto de seguir o conselho da Dora, personagem da Fernanda Montenegro em Central do Brasil, e começar a só andar de ônibus. Dora dizia que o transporte público era mais seguro do que os táxis por passarem sempre pelos mesmos lugares. Leite acrescenta que são mais seguros também porque a gente sabe que, independente do dia ou da hora, a passagem vai custar sempre a mesma coisa. E quanto mais perto descermos de onde o pegamos, menos pagamos.
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