quinta-feira, janeiro 18, 2007

quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

ESTEREÓTIPOS, SEGUNDO O AURÉLIO, SÃO O MESMO QUE CLICHÊS
Este mês, a revista Playboy capturou a “perseguida” da surfista Andréa Lopes. Já na edição da semana passada de CartaCapital, o especialista em empresas e negócios, Thomaz Wood Jr., escreveu sobre a decisão tomada em dezembro de 2005, pelo dono da Clark Foam, Gordon Clark, de fechar a mais tradicional fabricante de blocos de poliuretano com que são feitas as pranchas de surf.

A Clark Foam detinha 90% do mercado norte-americano e 60% do mundial, o que vai garantir uma aposentadoria tranqüila a Clark, surfista septuagenário que, na década de 60, começou o negócio para poder estar próximo ao mar e do surf.

Segundo Wood, Clark, que estudou matemática, física e química, “costumava ser comparado a Bill Gates, pelo seu poder e controle da cadeia produtiva, e a Howard Hugues, por seu comportamento recluso e excêntrico”.

Especula-se que, além de concluir que, daqui a poucos anos, será difícil disputar mercado com os blocos chineses que começam a invadir as oficinas de shapers de todo o mundo, Clark avaliou os prejuízos que sua atividade vinha causando ao meio ambiente e optou por encerrar seu negócio milionário. Claro, há também o aspecto de que Clark já não é nenhum garoto e, aparentemente, não tem herdeiros que se interesse por tocar a Clark Foam.

No Natal passado, ao passar por uma loja Americanas, me surpreendi ao me deparar com quatro dvd´s, edições especiais de filmes dirigidos pelos surfista Bruce Brown entre os anos 1960 e 1970.

Brown é um dois maiores responsáveis por construir no imaginário coletivo o mito do surfista em busca de ondas perfeitas e do verão sem fim, título de seu filme mais conhecido – Endless Summer. Brown influenciou tudo o que veio depois em termos de filmes sobre surf, demonstrando que era possível capturar a atenção do público leigo e ganhar muito dinheiro com isso.

Em 2002, no Brasil, o filme Surf Adventures foi produzido pela Conspiração Filmes, de olho apenas nos surfistas. Embora o projeto inicial fosse levar a película à telona, os envolvidos não esperavam que o filme atraísse 200 mil pessoas ao cinema, tornando-se o terceiro documentário mais visto no país, naquele ano. Hoje, o dvd também está a venda nas mesmas lojas Americanas. Inclusive de Brasília, a mais de mil quilômetros da praia mais próxima.

Nos EUA, um ano depois, o ex-skatista, ex-surfista, ex-empresário e, como Clark, milionário, Stacy Peralta lança o documentário Riding Giants, sobre o surf e os surfistas que desafiam ondas gigantes, equivalentes a prédios de quatro, cinco andares.

(Dois anos antes, Peralta havia ganhado o prêmio de melhor direção de documentários no mais prestigiado festival de cinema independente americano, o Sundance, com seu filme sobre a evolução do skate e o significado da existência da equipe Zephir. O roteiro de Dogtown and Z-Boys é tão bom e legítimo que Peralta não teve dificuldade para convencer o ator Sean Penn a ser o narrador da história. E ainda foi contratado por estúdios de Holliwood para escrever um roteiro fictício sobre a mesma história, que virou filme e pode ser encontrado em quase todas as locadoras. No entanto, se for o caso, prefira o documentário original).

Voltando ao Brasil, em 2004, o documentário Fábio Fabuloso, uma videobiografia sobre a trajetória do paraibano Fábio Gouveia, um dos surfistas mais carismáticos da história do esporte, ganhou os prêmios de melhor documentário, segundo o público, no Festival do Rio de Janeiro, e do júri oficial, na Mostra de Cinema de São Paulo. Além das cenas com a família, dos detalhes sobre as dificuldades para deixar a vida simples na Paraíba e se adaptar às ininterruptas viagens ao redor do mundo, do fato do “Fia” ser um piadista e, lógico, de muito surf em ondas de qualidade, a ótima trilha sonora, mesclando ritmos nordestinos à música eletrônica, e o roteiro narrado em forma de cordel conquistaram a simpatia do público. Tanto que também está a venda nas...Lojas Americanas.

O octacampeão mundial Kelly Slater é nome de jogo de vídeo-game. Filmes publicitários utilizam a imagem de surfistas para vender cerveja, carros e outras bugigangas para as quais querem dar um ar “cool”. E, tenho certeza, você com certeza tem em seu guarda-roupa uma peça de roupa de alguma marca de surfwear ou ao menos uma bermuda de tactel, adotada como uniforme oficial dos surfistas.

Então, se você é daqueles que ainda vêm os surfistas como uma bando de idiotas desmiolados e não entendeu o sentido deste texto, aqui vai uma última chance para você refletir sobre estereótipos.

Em 2003, em parceria com Drew Kampion, o mesmo Bruce Brown que dirigiu Endlles Summer lançou um livro de luxo, com capa dura, pela seletíssima editora Taschen. O nome do livro, Stoked – História da Cultura do Surf, deixa bem claro sua pretensão. Mostrar como, desde que era praticado por reis havaianos, o surf influenciou nossa cultura, seja na música, na moda, seja no comportamento e, mais recentemente, nas artes plásticas.

Já no prefácio do livro, Brown ironiza o velho preconceito em torno dos surfistas. “Um livro sobre a cultura do surf. Bah! Sempre nos disseram que éramos um bando de inconscientes sem cultura. No início dos anos 1950, quando comecei a surfar, o comentário mais freqüente de meus pais e amigos não surfistas era: “Quando crescer, você se dará conta de que esteve perdendo tempo, ao invés de fazer algo de útil”.

Brown continuou não só fazendo o inútil como, a partir de dado momento, concluiu que valia a pena registrar seus amigos praticando aquela inutilidade. The Endless Summer fez tanto sucesso que atraiu a atenção de estúdios de Hollywood. No entanto, todos diziam a Brown que, para triunfar, ele deveria se mudar para a Cidade dos Sonhos. Ao que ele respondia. “Prefiro ser leiteiro na praia que viver em Hollywood, longe do mar”.

Brown seguiu sua crença e, se não fez sucesso na indústria cinematográfica, ao menos parece um sujeito realizado nos extras da coleção de dvd´s lançada quarenta anos após sua filmagem.

Um comentário:

Lidia disse...

Bah, o começo do texto anunciava algo mais divertido... rsrsrs