Após 30 anos de militância, a senadora Marina Silva (AC) deixou o PT, legenda que ajudou a criar e a chegar ao poder.
De acordo com a carta que divulgou à imprensa há pouco, a ex-ministra do Meio Ambiente concluiu que seus companheiros não estavam dispostos "a se assumir, inteira e claramente, como agentes da luta por um Brasil justo e sustentável e a fazer prosperar a mudança de valores e paradigmas que sinalizará um novo padrão de desenvolvimento".
Como sua saída do PT e a consequente filiação ao PV indicam sua intenção de concorrer à Presidência da República, em 2010, a decisão de Marina tem um impacto ainda mal avaliado para a disputa que se aproxima.
Para o desgosto de quem preferia uma eleição em clima de Fla X Flu - um referendo a comparar duas gestões essencialmente muito parecidas - e regozijo da oposição, essa mulher tem um histórico respeitável junto aos movimentos sociais e promete oxigenar o debate político. Pode não ganhar (poucos acreditam nesta hipótese), mas desde já sua presença é saudada como algo que irá qualificar um debate que, até então, bipolar, tinha tudo para ser mais do mesmo.
No tocante a este blog, que fique explícito que, confirmada a candidatura, Marina receberá ao menos um voto semifosco no primeiro turno. Ainda que preferisse não votar no PV.
Conforme comentário que postei em um artigo do jornalista Mino Carta, de um partido que diz ter apreço pela democracia e que tem entre seus quadros alguém como Marina - partido este ao qual não sou filiado, mas em cujos candidatos tenho votado ao longo dos últimos anos - o mínimo que eu esperava era que submetesse o nome da senadora e da hoje candidata, a ministra Dilma Rousseff, à prévias partidárias, para que TODOS os petistas escolhessem quem melhor representa seus ideais e programas.
Tornou-se pública nas últimas semanas, tendo sido objeto de conversa fraterna entre nós, a reflexão política em que me encontro há algum tempo e que passou a exigir de mim definições, diante do convite do Partido Verde para uma construção programática capaz de apresentar ao Brasil um projeto nacional que expresse os conhecimentos, experiências e propostas voltados para um modelo de desenvolvimento em cujo cerne esteja a sustentabilidade ambiental, social e econômica.
O que antes era tratado em pequeno círculo de familiares, amigos e companheiros de trajetória política, foi muito ampliado pelo diálogo com lideranças e militantes do Partido dos Trabalhadores, a cujos argumentos e questionamentos me expus com lealdade e atenção.
Não foi para mim um processo fácil. Ao contrário, foi intenso, profundamente marcado pela emoção e pela vinda à tona de cada momento significativo de uma trajetória de quase trinta anos, na qual ajudei a construir o sonho de um Brasil democrático, com justiça e inclusão social, com indubitáveis avanços materializados na eleição do Presidente Lula, em 2002.
Hoje lhe comunico minha decisão de deixar o Partido dos Trabalhadores. É uma decisão que exigiu de mim coragem para sair daquela que foi até agora a minha casa política e pela qual tenho tanto respeito, mas estou certa de que o faço numa inflexão necessária à coerência com o que acredito ser necessário alcançar como novo patamar de conquistas para os brasileiros e para a humanidade. Tenho certeza de que enfrentarei muitas dificuldades, mas a busca do novo, mesmo quando cercada de cuidados para não desconstituir os avanços a duras penas alcançados, nunca é isenta de riscos.
Tenho a firme convicção de que essa decisão vai ao encontro do pensamento de milhares de pessoas no Brasil e no mundo, que há muitas décadas apontam objetivamente os equívocos da concepção do desenvolvimento centrada no crescimento material a qualquer custo, com ganhos exacerbados para poucos e resultados perversos para a maioria, ao custo, principalmente para os mais pobres, da destruição de recursos naturais e da qualidade de vida.
Tive a honra de ser ministra do Meio Ambiente do governo Lula e participei de importantes conquistas, das quais poderia citar, a título de exemplo, a queda do desmatamento na Amazônia, a estruturação e fortalecimento do sistema de licenciamento ambiental, a criação de 24 milhões de hectares de unidades de conservação federal, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e do Serviço Florestal Brasileiro. Entendo, porém, que faltaram condições políticas para avançar no campo da visão estratégica, ou seja, de fazer a questão ambiental alojar-se no coração do governo e do conjunto das políticas públicas.
É evidente que a resistência a essa mudança de enfoque não é exclusiva de governos. Ela está presente nos partidos políticos em geral e em vários setores da sociedade, que reagem a sair de suas práticas insustentáveis e pressionam as estruturas políticas para mantê-las.
Uma parte das pessoas com quem dialoguei nas últimas semanas perguntou-me por que não continuar fazendo esse embate dentro do PT. E chego à conclusão de que, após 30 anos de luta socioambiental no Brasil - com importantes experiências em curso, que deveriam ganhar escala nacional, provindas de governos locais e estaduais, agências federais, academia, movimentos sociais, empresas, comunidades locais e as organizações não-governamentais - é o momento não mais de continuar fazendo o embate para convencer o partido político do qual fiz parte pro quase trinta anos, mas sim o do encontro com os diferentes setores da sociedade dispostos a se assumir, inteira e claramente, como agentes da luta por um Brasil justo e sustentável, a fazer prosperar a mudança de valores e paradigmas que sinalizará um novo padrão de desenvolvimento para o País. Assim como vem sendo feito pelo próprio Partido dos Trabalhadores, desde sua origem, no que diz respeito à defesa da democracia com participação popular, da justiça social e dos direitos humanos.
Finalmente, agradeço a forma acolhedora e respeitosa com que me ouviu, estendendo a mesma gratidão a todos os militantes e dirigentes com quem dialoguei nesse período, particularmente a Aloizio Mercadante e a meus companheiros da bancada do Senado, que sempre me acolheram em todos esses momentos. E, de modo muito especial, quero me referir aos companheiros do Acre, de quem não me despedi, porque acredito firmemente que temos uma parceria indestrutível, acima de filiações partidárias. Não fiz nenhum movimento para que outros me acompanhassem na saída do PT, respeitando o espaço de exercício da cidadania política de cada militante. Não estou negando os imprescindíveis frutos das searas já plantadas, estou apenas me dispondo a continuar as semeaduras em outras searas.
Que Deus continue abençoando e guardando nossos caminhos.
Saudações fraternas
Marina Silva"
3 comentários:
Namastê, Marina!
Namastê, Semifosco!
Simplesmente, digno!
:)
Confesso que quando soube disso também fui tomado de súbita esperança, mas cético que fiquei, desconfiado de uma vida ideologicamente bem engendrada, que independe da boa intenção ideológica do sujeito governante, que no máximo, possibilita apenas uma redução de danos travestida de “desenvolvimento sustentável”, jamais alteração de paradigmas. Então minha esperança NISSO morreu. E mesmo assim não compartilho do pragmatismo petista. Só não dá mais para acreditar nesse sistema representativo "para inglês ver". Por falar nisso, não achou constrangedora a empolgação planetária com o presidente negro americano quando eleito? Acreditando que ele é o homem mais poderoso do mundo? Não sei... acho que os homens mais poderosos do mundo não estão nos governos, talvez os governantes sejam meros fantoches com uma dupla função: Deixar o verdadeiro poder subsumido e manter a ilusão da escolha. Não sei... acho que os presidentes que eu gostaria de escolher de fato, estão nas reuniões de acionistas da Shell, da Monsanto, da Cargill, da Roche, da FOX, da Petrobrás, do Itaú e etc. Estes sim faria questão de escolher! Aliás, tá aí uma boa campanha: Diretas já pra presidente da Monsanto!
Abraços da confraria semifosca!
Paulo.
Terei ouvido eccos de "The Corporation"??? Questionamentos complexos, hein irmão?
Acho que esse "pragmatismo" com o qual você, e milhares de pessoas não concordam, é o efeito maléfico do que chamam de "realpolitk", desculpa ao atual "pragmatismo" travestido de "defesa da governabilidade".
Eu, por minha vez, só acho merecedor de minha esperança aqueles que representem uma possibilidade de "alteração de paradigmas", como Lula o foi em dado momento.
Ou, como dizia o carimbador maluco beleza, "não diga que a vitória está perdida se é de batalhas que se vive a vida". E tenho dito...
Abraço
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