terça-feira, janeiro 08, 2013

Leite Derramado


Desde que empaquei antes de chegar à metade do primeiro romance publicado por Chico Buarque, devidamente intitulado Estorvo (prêmio Jabuti de melhor romance de 1992, embora eu ache que foi o jornalista Paulo Francis quem disse que o livro era realmente um estorvo) nunca mais havia me interessado por ler qualquer outro livro escrito pelo genial compositor. Até ganhar um exemplar de Leite Derramado, lançado em 2009.

A história do idoso preso a uma cama de hospital que relembra episódios de vida misturados à saga da própria família, desde ancestrais fidalgos portugueses, passando por um barão, um senador, até chegar a um neto, garotão do Rio de Janeiro atual, é tão envolvente que me bastaram dois dias para dar conta das 195 páginas. 

Ou Chico aperfeiçoou-se como ficcionista ou eu, como  acho mais provável, tornei-me capaz de apreciar sua prosa. A ponto de estar pensando em me dar mais uma chance  de ler o Estorvo. (Pensei também em ler Budapeste, muito embora, como já escrevi aqui, a adaptação do livro para o cinema seja sofrível e afugente o neófito na obra literária de Chico)


"Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na raiz da serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental, não é por causa da morfina. Você vai dispor dos rendados, dos cristais, da baixela, das joias e do nome da minha família. Vai dar ordens aos criados, vai montar no cavalo da minha antiga mulher. E se na fazenda ainda não houver luz elétrica, providenciarei um gerador para você ver televisão. Vai ter também ar condicionado em todos os aposentos da sede, porque na baixada hoje em dia faz muito calor. Não sei se foi sempre assim, se meus antepassados suavam debaixo de tanta roupa. Minha mulher, sim, suava bastante, mas ela já era de uma nova geração e não tinha a austeridade da minha mãe.(clique aqui para ler todo o primeiro capítulo)"


Nenhum comentário: