domingo, janeiro 27, 2013
O compositor cronista
Enterrem meu cartão de crédito na curva do rio. Por favor! Eu vos imploro, pois estou sofrendo compulsivamente, compulsoriamente.
Já prometi a mim mesmo não voltar a comprar mais nenhum livro até conseguir pôr em dia a leitura e dar cabo da pilha de obras que vão se avolumando no meu compartimento secreto - uma dispensa transformada em biblioteca -, mas quem resiste a um Aldir Blanc no sebo.
Para quem não está juntando lé com cré, trata-se do compositor, psiquiatra e boêmio carioca da safra de Millôr, Jaguar e companhia (surfistas, skatistas e roqueiros, meus três habituais leitores talvez não os conheçam), de quem ele deve ter recebido boas dicas para escrever crônicas tão saborosas e divertidas quanto as reunidas neste Rua dos Artistas e Transversais (ed. Agir, 2006, 428 páginas). E para quem pensa não conhecer o moço nascido em 1946, bom, Aldir é compositor de diversas músicas conhecidas, parceiro de João Bosco, Ivan Lins, entre outros.
Frasista de mão cheia ("tudo em ordem na mais completa desordem"; "meu avô, comovido até os suspensórios"; tinha a cinematográfica segurança das pessoas falsamente virtuosas"; "a infância é uma idade na qual são permitidas só algumas das infantilidades dos adultos"), nos momentos mais inspirados Aldir chega a lembrar o Nelson Rodrigues das crônicas de Óbvio Ululante. Debochado ("Quando a mulher ia quase na esquina, partindo digna como uma vaca ao crepúsculo, o Pombo saiu feito louco na calçada. De camiseta, cuecas, meias brancas e sapatos-tanque, com as mãos em concha e lágrimas nos olhos, pôs-se a gritar: - Volta! Pelo amor de Deus. Voooltaaa! Que nem um beque [zagueiro] central de time de subúrbio"), me lembrou Lima Barreto. Apologista dos poderes revigorantes dos bons amigos, do bom copo e de um bom papo, Aldir consegue condensar em uma crônica parte do que mais relevante a vida tem a ensinar.
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