terça-feira, dezembro 25, 2012

O Cinema da Melhor Idade


              “Ser velho significa que, apesar e além de ter sido, você continua sendo. E a consciência de continuar sendo é tão avassaladora quanto a consciência de ter sido”.

Philip Roth - in “O Animal Agonizante” (citado por Matheus Pichonelli, em Carta Capital)



O fato de que a população mundial está envelhecendo vem sendo apontado por demógrafos e especialistas do mundo todo há tempos. Já em 2002, a ONU previa que, até 2050, a quantidade de pessoas com mais de 60 anos vai superar a de jovens abaixo dos 15 anos de idade pela primeira vez na história.

Tal fenômeno produziu uma série de mudanças culturais, econômicas e políticas, como o surgimento de novas profissões,  bens e serviços voltados para o público da chamada terceira idade, que, muitas vezes, é um consumidor privilegiado.

Quem ainda parece não ter se dado conta disso são os produtores de cinema. Hollywood, por exemplo, produz poucos filmes com e para o público mais velho. Do cinema brasileiro, então, nem se fala. 

Há, óbvio, alguns bons títulos, como o excelente argentino Elza e Fred, mas basta passar os olhos na programação dos cinemas para identificar qual é o público prioritário para os produtores e diretores. Além do que, em meio ao que muitos classificam como a `infantilização da cultura´, mesmo quando os protagonistas da trama já passaram dos 60 anos, a história pouco tem a ver com as preocupações, os problemas e as alegrias  desta faixa etária. Na maioria das vezes, tanto faria se as personagens tivessem 30, 40 ou 70 anos. A abordagem seria a mesma. Em geral, pelo viés cômico, como em Alguém Tem que Ceder (Something's Gotta Give, 2003), com Jack Nicholson e Diane Keaton, ou o recente Um Divã Para Dois (Hope Springs, 2012). Daí que é mais fácil ver, nas telas, "a visão" de um iraniano sobre determinado conflito do que o ponto de vista de um idoso sobre a "aceleração" das comunicações e o "encolhimento" do mundo. 

Imagino que isso seja intencional, pois, assim, o filme tem mais chances de atingir a uma maior parcela do público, que se identifica mais facilmente com os percalços enfrentados pelo velhinho simpático ou mesmo pelo coroa antipático que, no fim, se redime da quase misoginia. Principalmente se a preocupação estiver relacionada a questões de sexualidade. Vale lembrar que, já nos anos 1970, o filósofo Edgar Morin destacava que “a cultura de massa desagrega os valores gerontocráticos, acentua a desvalorização da velhice, dá forma à promoção dos valores juvenis e assimila uma parte das experiências adolescentes”. O que há de mais representantivo da nossa cultura de massa que o cinema blockbuster?



Passei a atentar para isso após assistir, ainda no primeiro semestre, a um bom filme, uma exceção ao quadro descrito acima. E que, talvez por isso mesmo, por fazer menos concessões, parece ter passado batido por críticos e público. Trata-se de O Amor Não Tem Fim (Late Bloomers, 2011). Dirigido pela francesa Julie Gavras, filha do ícone cinematográfico Costa-Gavras e diretora do também excepcional A Culpa é do Fidel, o filme marca a volta da ainda bela Isabella Rossellini aos cinemas. Além de resgatar um dos grandes atores norte-americanos, Willian Hurt.  

No filme, os dois interpretam um casal em que cada um lida de forma diversa com a crise dos 60 anos. Para a mulher, simbolizada no fato de o marido receber, na primeira cena do filme, um prêmio pelo conjunto de sua obra, como se a fatura estivesse fechada e ele já não fosse produzir mais nada de importante. E é na forma como cada um vai lidar com o inevitável que se dá o grande choque da vida conjungal. 

Mais recentemente também assisti a O Exótico Hotel Marigold - espécie de Comer, Rezar, Amar da terceira idade, cujo grande mérito é reunir um elenco de primeira, com destaque para o jovem ator inglês Dev Patel, de Quem Quer Ser Um Milionário.

Tomara que isso simbolize uma mudança. 

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