Ano que vem eu volto a Paraty para vender camisetas com o slogan "Fui à Flip e não assisti a nenhum debate". Ou então "Fui à praia em busca de inspiração".
Exagero à parte, do pouco a que assisti este ano, um bate-papo em particular desceu quadrado. Desde então estou tentando digerir o raciocínio do experiente jornalista e escritor carioca Ruy Castro. Para resumir sua fala de mais de uma hora basta citar a canção Cariocas, da gaúcha Adriana Calcanhoto.
"Cariocas são bonitos
Cariocas são bacanas
Cariocas são sacanas
Cariocas são dourados
Cariocas são modernos
Cariocas são espertos
Cariocas são diretos
Cariocas não gostam de dias nublados
Cariocas nascem bambas
Cariocas nascem craques"
E o Rio é aquilo. E o Rio é não sei o que e mais um pouco. E se não é mais é por sei lá que causas externas. Razões que, segundo Castro, parecem superadas - mesmo que os fatos das últimas semanas, como a queda da popularidade do governador e do prefeito, as manifestações populares, a revelação de que as promessas do milionário carioca não passam disso e os novos confrontos em áreas ditas pacificadas contradigam o discurso otimista que norteou a mesa organizada pelo jornal paulista Folha de S.Paulo, com o improvável tema O Rio Voltou Mais Belo Que Nunca, Desta Vez Para Sempre (ou algo assim).
Veja bem, a questão nem é o Ruy Castro, que se propôs a ir a Paraty falar sobre as diferenças entre escrever crônicas, biografias e reportagens - proposta recusada pelo jornal paulista, que optou pelo infundado, mas aplaudido tema. Inteligente, articulado e bem-humorado, Castro é conhecido por ser um ferrenho defensor das qualidades pretéritas e presentes do Rio de Janeiro. Tanto que eu mesmo fui à Casa Folha sabendo de antemão o que iria ouvir e, admito, de espírito armado.
Concordo que, cenograficamente, o Rio é lindo (assim como são Alter do Chão (PA), Pipa (RN), Florianópolis (SC), Paraty (RJ), Brasília...) e que, por razões históricas e econômicas, o carioca, à força de muita divulgação, acabou associado à ideia-síntese do brasileiro (o que acho extremamente falso).
Só que por mais que eu ache louvável este sentimento de pertencimento a um lugar, acho limitador um formador de opinião ficar reforçando estereótipos do tipo o Rio é maravilhoso enquanto "em Brasília, os filhos do poder seguem tirando meleca do nariz e as mulheres dos políticos saem às ruas de bobe nos cabelos".
Entenda: não estou falando em defesa de Brasília. Tenho é preguiça para com esse papinho unilateral de "Ah, o Rio..."; "Ah, Paris à meia-noite"; "I Love NY". Ainda mais se a mesma frase reunir uma expressão de crença em um "novo protagonismo cultural" em tempos em que a digitalização permite à descentralização tanto da produção quanto do consumo cultural.
Ruy Castro tem suas razões pessoais e profissionais para amar o Rio de Janeiro. Woody Allen tem suas razões comerciais para fazer os guias de viagem cinematográficos a que vem se dedicando nos últimos anos (e já disse que quer rodar um filme no Rio. Basta o governo fluminense injetar dinheiro para termos mais uma peça publicitária para reforçar como o Rio é maravilhoso, mesmo com a ganância de seu setor hoteleiro). A questão, me parece, é cada um buscar seus motivos para louvar outros destinos menos óbvios. Pode ser o sorvete Marabaixo, de Macapá. As goianas. Um belo pôr-do-sol em Santos visto da Ponta da Praia. A loucura festiva de Belém. A água quente das praias nordestinas. As arquitetura grandiosa de Quito, no Equador. As seguras surpresas de Bogotá, na Colômbia. O pouco conhecido e barato caribe venezuelano....
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