domingo, outubro 23, 2011

FURO!


Justiça autoriza 33 mil crianças a trabalharem em lixões, fábricas de fertilizantes e obras

OUÇA:

Juízes e promotores de Justiça de todo país concederam, entre 2005 e 2010, 33.173 mil autorizações de trabalho para crianças e adolescentes menores de 16 anos, contrariando o que prevê a Constituição Federal. O número, fornecido à Agência Brasil pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), equivale a mais de 15 autorizações judiciais diárias para que crianças e adolescentes trabalhem nos mais diversos setores, de lixões a atividades artísticas. O texto constitucional proíbe que menores de 16 anos sejam contratados para qualquer trabalho, exceto como aprendiz, a partir de 14 anos.
Os dados do ministério foram colhidos na Relação Anual de Informações Sociais (Rais). Eles indicam que, apesar dos bons resultados da economia nacional nas últimas décadas, os despachos judiciais autorizando o trabalho infantil aumentaram vertiginosamente em todos os 26 estados e no Distrito Federal. Na soma do período, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina foram as unidades da Federação com maior número de autorizações. A Justiça paulista concedeu 11.295 mil autorizações e a Minas, 3.345 mil.

Segundo o chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do MTE, Luiz Henrique Ramos Lopes, embora a maioria dos despachos judiciais permita a adolescentes de 14 e 15 anos trabalhar, a quantidade de autorizações envolvendo crianças mais novas também é “assustadora”. Foram 131 para crianças de 10 anos; 350 para as de 11 anos, 563 para as de 12 e 676 para as de 13 anos. Para Lopes, as autorizações configuram uma “situação ilegal, regularizada pela interpretação pessoal dos magistrados”. Chancelada, em alguns casos, por tribunais de Justiça que recusaram representações do Ministério Público do Trabalho.
“Essas crianças têm carteira assinada, recebem os salários e todos seus benefícios, de forma que o contrato de trabalho é todo regular. Só que, para o Ministério do Trabalho, o fato de uma criança menor de 16 anos estar trabalhando é algo que contraria toda a nossa legislação”, disse Lopes à Agência Brasil. “Estamos fazendo o possível, mas não há previsão para acabarmos com esses números por agora.”

ATIVIDADES INSALUBRES

Apesar de a maioria das decisões autorizarem as crianças a trabalhar no comércio ou na prestação de serviços, há casos de empregados em atividades agropecuárias, fabricação de fertilizantes (onde elas têm contato com agrotóxicos), construção civil, oficinas mecânicas e pavimentação de ruas, entre outras. “Há atividades que são proibidas até mesmo para os adolescentes de 16 anos a 18 anos, já que são perigosas ou insalubres e constam na lista de piores formas de trabalho infantil.”

No início do mês, o MPT pediu à Justiça da Paraíba que cancelasse todas as autorizações dadas por um promotor de Justiça da Comarca de Patos. Entre as decisões contestadas, pelo menos duas permitem que adolescentes trabalhem no lixão municipal. Também no começo do mês, o Tribunal de Justiça de São Paulo anulou as autorizações concedidas por um juiz da Vara da Infância e Juventude de Fernandópolis, no interior paulista.

De acordo com o coordenador nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) Rafael Dias Marques, a maior parte das autorizações é concedida com a justificativa de que os jovens, na maioria das vezes de famílias carentes, precisam trabalhar para ajudar os pais a se manter.

“Essas autorizações representam uma grave lesão do Estado brasileiro aos direitos da criança e do adolescente. Ao conceder as autorizações, o Estado está incentivando [os jovens a trabalhar]. Isso representa não só uma violação à Constituição, mas também às convenções internacionais das quais o país é signatário”, disse o procurador à Agência Brasil.

Marques garante que as autorizações, que ele considera inconstitucionais, prejudicam o trabalho dos fiscais e procuradores do Trabalho. “Os fiscais ficam de mãos atadas, porque, nesses casos, ao se deparar com uma criança ou com um adolescente menor de 16 anos trabalhando, ele é impedido de multar a empresa devido à autorização judicial.”

Procurado pela Agência Brasil, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não se manifestou sobre o assunto até a publicação da matéria.

Leia também:
Juízes que autorizam trabalho infantil ignoram realidade, diz chefe da Fiscalização do Ministério do Trabalho

Autorizações são uma grave lesão do Estado aos direitos da criança e do adolescente, diz procurador

terça-feira, outubro 18, 2011

Guarujaense volta a vencer e continua sendo principal promessa brasileira de título mundial




Único surfista brasileiro a já ter ocupado, ainda que temporariamente, o primeiro lugar do ranking mundial, o guarujaense Adriano Mineirinho voltou a vencer uma etapa da primeira divisão do circuito profissional de surf. Nesta terça-feira (18), o atleta de 24 anos não apenas faturou o título do Rip Curl Pro, como calou os que ainda não haviam engolido sua vitória na terceira etapa do World Tour Masculino (WTC), em maio deste ano.

Se em maio as ondas da Barra da Tijuca não estavam tão boas e Mineirinho contou com o apoio da torcida local - o que motivou críticas de quem achou que uma de suas ondas não merecia a pontuação que os juízes lhe deram -, desta vez o brasileiro derrotou ninguém, ninguém menos que o mito, o dez vezes campeão mundial, Kelly Slater. E isso ocorreu em ondas perfeitas e tubulares de mais de dois metros, na praia de Supertubos, em Peniche, Portugal, valorizando o feito de Mineirinho.

Além de um cheque de US$ 75 mil, o guarujaense conquistou 10 mil pontos, o que lhe permite saltar da sexta para a terceira posição no ranking do World Tour. Ainda durante as quartas-de-final, Mineirinho surfou um tubo perfeito, obtendo a primeira nota dez de sua carreira.

 Outro brasileira a ir bem no campeonato foi o cearense Heitor Alves, que terminou em quinto lugar, barrado por Kelly Slater nas quartas-de-final. 

Apesar de perder para Mineirinho, Slater também não tem do que reclamar. Com o segundo lugar obtido hoje, o norte-americano está muito perto de conquistar o 11º título mundial de sua carreira. Para isso, basta que ele avance à quarta fase na próxima etapa, que acontecerá em São Francisco (EUA), entre os dias 1 e 12 de novembro.

leia também: Um Brasileiro no Topo do Surf Mundial (clique aqui)

segunda-feira, outubro 17, 2011

Desocupem Wall Street

Três vivas à madrinha Naninha. Uma das poucas ou pelo menos a única pessoa que conheço que não tem cartão de banco, celular, contas em redes sociais e que não sabe dirigir. Limitada? Talvez, mas posso lhes garantir que ela não parece nem um pouco infeliz por não saber usar um caixa eletrônico.

Toda vez que precisa sacar um dinheirinho da pensão que o governo deposita em uma conta que ela foi obrigada a abrir contra sua vontade a madrinha apresenta o RG às "mocinhas" da casa lotérica, onde aproveita para trocar suas Telesenas. E quando uma irmã ainda mais "vivida" se põe a criticá-la dizendo que ela perde tempo em filas, ela se limita a lembrar que máquina não precisa de emprego, salário, comida, nem moradia. "Imagina, meu filho. É tanto velho conversando fiado na fila que a gente se põe a par de tudo de que precisa saber para ir tocando a vida". 

Se alguém precisa falar com ela sabe onde, como e quando encontrá-la. E a própria madrinha reconhece: na sua idade, nada mais é tão urgente que não possa esperar até ela voltar das compras. Além do mais, sua rede social está ao alcance de uma boa caminhada ou, na pior das hipóteses, de uma viagem de ônibus. Ônibus que, apesar do descaso público e com um pouco de paciência, pouparam a ela o sacrifício de ter que ter um carro. 

Sim. O mundo da madrinha Naninha é anacrônico, ultrapassado e aos poucos vai desaparecendo. Ela não sabe o que é um Ipod, um Iphone ou um tablet. Por outro lado, já viveu o bastante para saber que independentemente de sua indiferença ou entusiasmo pelas últimas invenções do homem, elas se tornarão peças de museu antes dela. Mais rapidamente que o bip, o walkman ou o orkut que ela nunca chegou a usar, mesmo todos dizendo que eram imprescindíveis. 

Se precisasse se justificar, a madrinha diria já ter vivido o bastante para saber que estar a par da última tendência não é o bastante para retardar a passagem do tempo. Ela, no entanto, nunca refletiu sobre isso. Assim como não pensa nos custos dos empréstimos bancários, na Bolsa de Valores ou em Wall Street. Ainda assim, provocada pelo seu repórter de tv preferido, a madrinha vaticina à televisão ligada sobre o altar da santa de sua devoção. 

"Ocupar [Wall Street]?!?! Se esses homens fazem o que eles [os manifestantes] estão dizendo que fazem, as pessoas deviam era estar brigando para DESOCUPAR este lugar. Imagina todos estes prédios transformados em moradia para quem não tem casa". Imagina, madrinha, imagina.


Leia também:
Nomes Anacrônicos (clique aqui)   
Madrinha Naninha e o Pós-Sentimento (clique aqui)
E agora, José (clique aqui)

Peso Instrumental

Há um ano não via o Macaco Bong tocar. Daí minha surpresa ao fim do show que a banda deu nesse domingo (15), em Brasília. O som do power trio (e bota power nisso!) parece ter ficado ainda mais rápido e pesado durante este meio tempo. Além de complexo. Por mais que a atitude soe rock´n´roll, seria difícil e injusto compartimentar a banda instrumental de Cuiabá (MT) em um único gênero. A ouvidos atentos (e olha que este não é o meu caso) é fácil identificar algo de jazz em em meio a toda técnica e improviso. Assim como dá para notar os ótimos músicos, cada qual a seu jeito, distorcendo harmonias tradicionais. O som dos caras é tão porrada que sai cansado só de ouvir e vê-los tocar. O que eu ainda não consegui assimilar é o comportamento do público brasiliense. Tudo bem que as poltronas da Funarte e estupefação geral diante da massa sonora vinda do palco desestimulavam a maior parte do público a coreografar espasmos corporais, mas se levantar e sair sem pedir bis....isso já é ser blasé demais. Da vez anterior que vi a banda ao vivo, em São Paulo, as músicas finais deram espaço a uma verdadeira catarse, com a platéia pedindo bis e mais bis.


Outra boa surpresa foi conhecer a banda acreana Caldo de Piaba, que abriu para o Macaco Bong a última noite do projeto Novas Fronteiras. Seja nas composições próprias, seja na releitura instrumental de clássicos do cancioneiro popular (sobretudo da Região Norte), o grupo tempera seu rock ligeir com toques de lambada, guitarrada e até ska. O cd dos caras pode ser baixado gratuitamente no site Na Agulha.


Ação Afirmativa


Porque os caiçaras não têm direito à cotas, a um dia nacional, um site ponto gov., à programa na tv, à preservação de territórios originais (alô, Ilha Diana, aquele abraço. Alô, povo do Ribeira), a mensagem oficial das autoridades constituídas...

sábado, outubro 15, 2011

Música Paraense - Muito Alem do Calypso (2)

Ainda descobrindo pérolas musicais do Pará, estado onde os artistas, conforme assinalou o crítico Pedro Alexandre Sanches, compõem um caldeirão heterogêneo cujo único ponto cem por cento em comum é a bandeira paraense. 

leia também: Música Paraense - Muito Alem do Calypso


Um produtor musical e dj com mais de dez anos de estrada. Uma jovem cantora com uma voz impressionantemente madura. Pro.efX e Nanna Reis uniram seus talentos e deram asas ao Projeto Charmoso
, com o qual vão misturando ritmos paraenses (como, óbvio, a guitarrada) e outros à música eletrônica. O resultado é um trabalho dançante e envolvente que não esconde a bela voz de Nanna.


Cantor, compositor e jornalista paraense, Arthur Nogueira já lançou dois cds, Arthur Nogueira [2007] e Mundano [2009]. O segundo, premiado no tradicional Projeto Pixinguinha, da Fundação Nacional de Artes [Funarte], pode ser baixado gratuitamente no site do artista.


O melhor é deixar que Coletivo Rádio Cipó fale por si próprio ..."pensar que tudo teve início meio que na brincadeira, em 2001. Quando o produtor e músico Carlinhos Vas, mais o engenheiro agrônomo Erik Martinez começaram a brincar com barulhinhos estranhos tirados de um microcomputador. Quem também tava na bagunça eram o radialista e compositor Rato Boy, figurinha das antigas, além do percussionista Luis Bolla. Nesse "conjunto de idéias coletivas", foi um passo pra que a comunidade da Álvaro Adolfo, da Pedreira, entrasse na onda e participasse das ações do grupo. Não parou de chegar moleque desocupado querendo participar das oficinas de percussão e ritmos eletrônicos.  Ensaios abertos eram realizados, inserindo um canal de intercomunicação sócio-cultural e proporcionando ações de entretenimento e lazer na comunidade. E não parou por aí – na real, tava era longe de parar"



Já escrevi aqui que, salvo algumas exceções, não curto o reggae brasileiro. Pura implicância com as letras e com o fato de achar que, em geral, musicalmente, as bandas nacionais não conseguem agregar nada de novo ao ritmo jamaicano. Juca Culatra, para mim, se encaixa nesta situação. Só que suas letras são tão nonsense que se tornam engraçadas (ouça Dino Sapiens). Além disso, a chance de quem gosta do ritmo e discordar da minha tese quanto à qualidade do reggae brasileiro curtir seu som é muito grande. Até porque, ele não deixa nada a desejar em comparção com a maioria das bandas brasileiras do gênero. Ou seja, minha avaliação é totalmente pessoal (como tudo mais neste blog) e sei relativizá-la. No calor de Belém, com uma Cerpinha em mãos, deve ser bom para dançar.



Projeto Secreto Macacos. Este som eu achei duca. Conheci um dos integrantes da banda numa das lojas da Na Music. Inicialmente eu não entendi nada sobre o que ele tentava me explicar ser a proposta do grupo - fazer um som diferente de tudo que já tinham feito, conforme a banda admite em sua página da banda no myspace. Depois, já em Brasília, ouvindo o som dos caras, entendi a dificuldade de definir o que eles fazem. Dava tudo para ver um show deles com o Macaco Bong


Como escrevi no início, a vocalista do Projeto Charmoso, Nanna Reis, tem uma já longa carreira solo, já tendo vencido vários festivais regionais de música. Apesar disso, a julgar pelas músicas disponíveis em sua página no myspace, a jovem ainda está em busca de sua personalidade artística, de forma que talvez seja cedo para apostar em que raia ela vai disputar um lugar na música popular brasileira. Talento (e, por que não dizer, beleza) para chegar lá ela tem.


Acho que, a esta altura, os experimentos musicais de Pio Lobato já são bastante conhecidos do público que acompanha a música independente nacional. Músico licenciado pela Universidade Federal do Pará, o artista obteve destaque ao misturar os elementos regionais, sobretudo paraenses, à música eletrônica. Duas de suas músicas compõem a trilha do filme Deus é Brasileiro, de Cacá Diegues.



Para voltar a algo mais calmo, vá de Lu Guedes

Floresta Sonora me empolgou deveras....rs,rs,rs,rs Uma faixa como esta do vídeo abaixo, Futurando, dá vontade de se jogar na pista (de dança ou de skate. É das bandas que eu mais tenho ouvido no meu micro enquanto trabalho, dando asas à imaginação ao sabor do som viajeiro do trio que diz fazer "musica para reconstrução de sensações e imagens de dentro para fora do corpo". Portanto, colegas de serviço, se me virem com o fone na orelha, batendo os pés e sacudindo a cabeça, é Floresta Sonora.

Merengue, cúmbia (a música típica colombiana), dub, forró. É a "Lambada do Povão" no som do Metaleiras da Amazônia, um projeto de resgate e preservação das tradições culturais paraenses

sexta-feira, outubro 14, 2011

Fim da "greve de bom-senso" do Correio

Após cometer a barbaridade de publicar que os ... (ahmm....ééé´....)... que as pseudo-celebridades Fiuk e Wanessa (ex-Camargo) decidiram “agitar” o pop nacional “trazendo elementos novos para a música brasileira”, o jornal Correio Braziliense enfim abre a janela para permitir que novos ares ventilem a redação. E descobre (assim como o semifosco aqui – veja os posts abaixo) a nova música paraense.

A música produzida no Norte e Nordeste do Brasil ganhou visibilidade há alguns anos; principalmente, depois do movimento mangue beat, que teve como ícone o músico Chico Science. Hoje, uma das cenas mais comentadas, fora do eixo centro-sul, é a paraense, que lançou nomes como Gaby Amarantos (observação minha: tem muita, mas muita coisa melhor que a "Beyoncé paraense" rolando no estado). Outra cria dessa ebulição musical é o CD Kistch, pop, cult, do músico Felipe Cordeiro.
(para ler o restante da matéria `Músico paraense procura aliar proposta conceitual e ritmos´, clique aqui)
Goste ou não das letras de Cordeiro e do recurso (a meu ver equivocado) das backings vocals, há um aspecto inegavelmente positivo em seu trabalho, que é o enraizamento na musicalidade paraense, que não se perde em meio às referências pop do compositor. 

quarta-feira, outubro 12, 2011

A Cinematografia da Crise

O mundo inteiro ainda sofre com os desdobramentos da crise econômica mundial que teve início em 2008, nos Estados Unidos. Nações atingidas pela turbulência causada pelo verdadeiro tsunami que paralisou a economia mundial, varreu milhares de postos de trabalho e levou de bancos à empresas dos mais diversos setores à bancarrota continuam procurando formas de evitar uma quebradeira geral. E pagando a conta. Principalmente os países hoje mais severamente endividados por terem socorrido financeiramente setores da economia que estavam em risco de falência, como os bancos.

Em meio a este cenário - apocalíptico, diriam alguns -, dois filmes recentemente lançados em DVD abordam as causas e as consequências da crise. Ou melhor, as consequências da ganância e da soberba dos operadores do sistema financeiro e da recente desregulamentação do setor, que se desassociou do mundo real, conforme diz um dos personagens do primeiro filme. (Obs: o mercado imobiliário brasileiro também não andará desassociado da realidade, pergunto eu)

Indicado ao Oscar deste ano, o documentário Trabalho Interno é um filme esclarecedor, embora não seja nada fácil acompanhá-lo. Isso porque o diretor Charles Ferguson optou por ouvir algumas das maiores autoridades no assunto, algumas delas credenciadas a falar sobre o tema justamente por terem participado ativamente das discussões e decisões equivocadas que levaram à crise do setor imobiliário norte-americano, à falência de bancos como o Lehman Brothers, à necessidade de o governo norte-americano socorrer a seguradora AIG e outros países fazerem o mesmo com suas instituições bancárias e empresas. Tudo isso sem que ninguém fosse responsabilizado e punido.

Narrado pelo ator Matt Damon, Trabalho Interno sustenta a tese de que a crise poderia ter sido evitada caso os governos não tivessem adotado cegamente, nas duas últimas décadas, o credo liberal de que o mercado pode regulamentar a si próprio. Caso da Islândia, outrora considerada um porto seguro. O documentário expõe as relações nada republicanas existentes entre governantes, agências reguladoras, lobistas, banqueiros, agências de ratting e até mesmo acadêmicos pagos para endossar fragilíssimas teses e argumentos. E registra a denúncia de que enquanto milhares de pessoas perdiam seus empregos, suas casas e condições para pagar por seu bem-estar social, diretores de empresas que só sobreviveram à crise graças à injeção de recursos públicos continuaram recebendo salários imorais de tão altos e gratificações sabe-se lá pelo quê. Além de deixar claro a total falta de credibilidade das agências de ratting, que, poucos dias antes de empresas falirem, continuavam apontando-as como excelentes investimentos.

Para Ferguson, os principais culpados pela derrocada são os homens que ocuparam a presidência dos Estados Unidos entre os anos de 1981 e os dias atuais, ou seja, Ronald Reagan, George Bush (pai e, mais recentemente, filho)e Barack Obama. Mas não só. O diretor também é enfático ao entrevistar assessores do segundo escalão dos sucessivos governos e cientistas.

 
Já o segundo filme é uma obra de ficção, embora não seja difícil imaginá-lo livremente inspirado nas muitas histórias reais registradas diariamente nos jornais. Com elenco de famosos (Ben Affleck, Tommy Lee Jones, Kevin Costner, Chris Cooper, entre outros rostos conhecidos), A Grande Virada conta a história de bem-sucedidos executivos que, diante da crise, perdem os empregos quando o conglomerado que ajudaram a construir ao longo de décadas decide fechar o departamento de construção naval sob o argumento de que a empresa precisa conter gastos e se adequar aos novos tempos, nos quais a "indústria pesada" perde atratividade.

O personagem central é Bobby Walker (Affleck), o pai de família de 37 anos há tempos afastado dos bancos escolares e mais jovem dos três personagens centrais da trama (os outros dois são Jones e Cooper). E também o que mais demora a perceber que os tempos mudaram e que não vai ser fácil conseguir voltar ao mercado. 

Apesar do final esperançoso, o filme é capaz de despertar em qualquer espectador realista a lembrança de que tudo que é sólido se desmancha no ar, ou seja, que os períodos de crise não são uma excepcionalidade, mas sim uma constante para a qual devemos estar preparados.

Quem assistir aos dois filmes não deixará de notar tal tese. Enquanto um dos entrevistados para Trabalho Interno aponta a contradição de um engenheiro civil ganhar muito menos que um engenheiro financeiro já que "o primeiro constrói pontes e o segundo, sonhos, mas se os sonhos dos financistas viram pesadelos são os outros que pagam", em A Grande Virada um personagem decepcionado caminha por um estaleiro abandonado comparando o passado e o presente. "Tinhamos milhares de homens trabalhando dia e noite aqui. Eles construiam navios. Podiam tocá-los, sentir seu cheiro. Hoje, fabricamos números".


Pode não parecer, mas neste momento que o Brasil atravessa uma fase de bonança e relativa estabilidade (embora a inflação insista em voltar a mostrar os dentes) é oportuno assistir a este tipo de filme. 


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Para quem se interessar, também vale procurar um filme um pouco mais antigo, Segunda-Feira ao Sol (2001), com Javier Bardem, sobre a crise do início da década passada na Europa e o desemprego na Espanha.
 
Há também uma produção argentina, As Viúvas das Quintas-Feiras (Las Viudas de Los Jueves), que descreve os efeitos da crise argentina para a emergente classe média. Creio que o filme não foi lançado no Brasil, mas nunca se sabe que surpresas se pode encontrar na net. Além do mais, o livro original da escritora argentina Cláudia Piñeiro, que é muito melhor que o filme, foi sim publicado por aqui. Eu mesmo já falei sobre ele há cerca de dois anos
 
 


terça-feira, outubro 11, 2011

quinta-feira, outubro 06, 2011

Música Paraense - Muito além do Calypso


Do carimbó ao metal, passando pelo samba e pelo pop rock, o que vi (em apenas três dias em Belém) e o que trouxe do Pará para ouvir na volta ao Planalto Central.  



A banda de pop rock Octoplugs vem da pequena cidade de Peixe-Boi, no interior do estado. Viajaram de ônibus para se apresentar no Projeto Ensaio Aberto, que é transmitido via webrádio, mas, infelizmente, a vocalista, pouco habituada aos imprescindíveis aparelhos de ar-condicionado de Belém, teve um perceptível problema de garganta. Com pouca gente na plateia, o grupo segurou bem a apresentação, levando-me a querer voltar a vê-los tocar em outras circunstâncias. A exemplo de outras bandas paraenses, os instrumentistas são muito bons.



Com dois anos de existência, a banda Arsenal Vil tem um vocalista com trejeitos poser, mas que se revela carismático e surpreende pelo tom de voz apropriado para exprimir as influências blues do grupo, enquanto o som do grupo soe como um competente clássico rock and roll. Desde que o Barão Vermelho deixou a sonoridade inicial de lado e o Celso Blues Boy sumiu que eu acho que não se ouve muito deste som aqui no Brasil.


Do cd Voyage, lançado em 2010 pela banda Aeroplano eu pincei a faixa Vermelho que é Rosa porque adorei a pegada dançante e o riff de guitarra.


Não dá para ver nada, né? Culpe ao sucesso da banda de metal Madame Saatan entre o público paraense. Não havia como se aproximar mais que isso do palco durante o show gratuito que a banda fez no dia 18/09, no Píer das 11 Janelas, em Belém, para lançar seu novo disco. Sou ruim de conta, mas se não havia ao menos três mil headbangers assistindo ao excelente show, faltavam poucos. E olha que digo excelente mesmo não curtindo muito o estilo. De qualquer forma, tenho que reconhecer que os caras tocam muito bem.


Albery Albuquerque. Putz! Este é aquele tipo de artista de quem a gente só ouve falar graças a uma casualidade, um lance de sorte, e então agradece aos inventores da internet por terem nos possibilitado sermos um pouco menos dependentes dos veículos de massa. Curte música experimental? Então não deixe de ouvir o trabalho deste compositor e professor universitário em sua página no myspace ( http://www.myspace.com/alberyalbuquerque)



Só pelo nome chamativo a banda Destruidores de Tóquio já merecia um crédito, mas o que me convenceu a comprar o cd O Avesso e o Avesso (muito bem produzido) foram as letras nonsense e este rock "limpo", tipo indie. O atendente com quem conversei disse que a banda goza de prestígio na cena paraense. Não duvido. É uma banda que eu adoraria ver ao vivo e cujo cd eu curto um pouco mais a cada audição.


Um gênero musical de origem indígena e com influências africanas pouco conhecido no Brasil, embora tenha influenciado a lambada e se espalhado por diversos países sob a forma do zouk. Isso é, em tese, o carimbó. O que não importa saber. Porque, na prática, na hora que o curimbó (tambor) soa, aí nego quer saber é de dançar conforme ficou evidente durante a apresentação do grupo Carimbó Som De Pau Oco.
Gênio! Assim Sebastião Tapajós é tratado por violonistas eruditos e populares do mundo inteiro. Nascido em Santarém, carrega muito da musicalidade regional em seu som que, a exemplo de boa parte do que é feito na Amazônia, sofre uma forte influência caribenha.



A Stereoscope já é conhecida pelo público de outras partes do país que acompanha a cena independente nacional. O vídeo abaixo eu mesmo fiz, durante uma apresentação da banda no Sesc Consolação, há pouco mais de um ano. Dos quatro discos já lançados, o último foi gravado e produzido em Brasília, por
Philippe Seabra (Plebe Rude). Em releases, o grupo, que revela ter sido influenciado positivamente por
Roberto e Erasmos Carlos, Paulo Sérgio, Júlio César Ribeiro, Paulo César Carpegianni, garotas bonitas, Fernando Mendes, clipes do ABBA e discos, afirma que leis de incentivo cultural são uma influência negativa.
Com forte influência de Jorge Ben e do samba-rock, a Sambiose aposta na já manjada mistura de samba, rock, jazz, funk e soul para fazer um som dançante e divertido

Cabanagem




Espécie de díario, este blog serve para eu registrar aquilo que me empolga ou incomoda. Serve também para eu compartilhar minhas impressões com os quatro amigos que me lêem (a audiência varia conforme a estação das ondas). Mas, no fundo, no fundo, serve principalmente para eu tentar ordenar minhas vagas idéias. O que, desta vez, está difícil.

Nos últimos anos eu tive a oportunidade e o privilégio de viajar um pouco. Dentro e fora do país. Confesso que, exceção a Colômbia, nenhum outro lugar me surpreendeu tanto quanto o Pará. Mesmo já tendo andado por lá a trabalho em outras duas ocasiões, a semana que tirei para conhecer parte do estado superou qualquer expectativa.

Estou contando isso somente para explicar que não sei muito bem como expressar a confusão que se instaurou em mim após constatar a efervescência cultural (principalmente musical) de Belém; aprender em Alter do Chão que mesmo a milhares de quilômetros da costa é possível encontrar praias lindas, ainda que sejam praias fluviais, sem a possibilidade de surf. E, por que não, conhecer Santarém.

Deem um desconto, mas o fato é que, diante de tantas descobertas, cheguei a sentir vergonha de ser paulista. Não de ter nascido em São Paulo, um estado tão bom e bonito quanto qualquer outro, mas sim de nossa pretensa autossuficiência, de nossos preconceitos, a falsa ideia de que somos a "locomotiva do país", que a modernidade reside entre a Rua Augusta e a Vila Madalena. "A banda é boa, mas o sotaque da vocalista me incomoda". Li isso em um comentário postado junto a um vídeo de uma das bandas paraenses a que assisti, escrito por alguém que era possível identificar como sendo paulista.

Óbvio que o buraco é mais embaixo. O paulista são muitos. Não dá para generalizar e se eu, um paulista privilegiado e relativamente bem-informado que mantém um blog sobre banalidades e cultura pop imaginava que a música paraense contemporânea não ia além da Banda Calypso, que culpa tem meus conterrâneos?

Que culpa tem o "pobre paulista" de não saber quem foi o frei abolicionista Francisco Luiz Zagalo, um dos ideólogos da Cabanagem (1835-1840), que dizia que "se alguma religião tinha era a que aprendera junto aos pedreiros livres de Caiena"? Ou que Belém já foi a terceira cidade em importância do país, como nos lembra a arquitetura local? De ignorar não apenas o potencial turístico do estado, mas também que boa parte dos minérios necessários para movimentar "a locomotiva" vem do Pará?

A culpa não é nossa se por muito tempo acreditamos haver um único sotaque apropriado ao padrão de excelência. De não sermos informados sobre a existência do Sairé, uma festa que, reza a lenda, tem trezentos anos de tradição. E de alguns gênios reconhecidos mundialmente, como Sebastião Tapajós, não terem o espaço que merecem. E de as vicissitudes, as carências, a miséria paraense não receber a mesma atenção que as nossas. Não. A culpa definitivamente não é nossa.

Mas porque estou falando em culpa? Pra isso viajamos. Para ver as coisas com nossos próprios olhos, aprender mais sobre a realidade e ver que o mundo não cabe no Fantástico a menos que em suas bordas também haja um mercado consumidor que valha o investimento necessário para expandir o "eixo" um pouco além de "Rio-São Paulo". No dia em que isso acontecer, aí sim teremos algo mais que apenas Calypso.

Com isso, encerro minhas confusas anotações sobre minha viagem ao Pará. Pelo menos até a próxima visita.