domingo, junho 09, 2013

E PUR SI MUOVE!


"Estamos vivendo / E, o que disserem, os nossos dias serão para sempre"

Ao menos um dos meus três leitores há de ter experimentado a sensação de que existem dias em que uma leve melancolia nos cai bem.

Não falo de solidão. Nem tampouco de tristeza, mas sim dos raros e preciosos momentos em que, estando a sós, uma determinada luz, sabor, cheiro ou lembrança nos remete para um lugar fora deste circo social decorativo. 

Pois é. "Hoje à tarde foi um dia bom". Fui tocado pela graça de uma melancolia que nada tem a ver com "a busca do tempo perdido" proustiana. Muito menos com o álibi para indústria farmacêutica entupir a todos com suas drogas - inclusive as crianças supostamente deficitárias de atenção (delas para com o mundo ou dos outros para com elas?). 

Alguém poderá dizer que melancolia não é a palavra exata, argumentando que este é um sentimento que imobiliza, quando estou justamente dizendo o contrário: foi um dia bom porque estou seguro de que tudo "si muove", principalmente eu em cima da bike que me possibilita ver a capital federal com olhos atentos de ... melancolia. 

Ocorre que, por oposição ao axé, à aeróbica do senhor, ao sertanejo universitário, ao arrocha em que alguns setores tentam transformar nossas vidas, penso que não só é o termo exato e provocativo, como que a melancolia em si é uma necessidade. Desde que leve, claro. Para deixarmos de sermos mimados. Para aprendermos a lidar com o "lado que pesa" e não apenas com aquele que "flutua".  

Sossego talvez fosse uma boa opção. "[Em Brasília] O sossego das nossas casas é muito libertador", declarou a cineasta Maria Coeli, 70 anos, ao Correio Braziliense, na semana passada. A frase, simplória, deve ter passado em branco para muita gente. Para mim, no entanto, no contexto mais amplo da entrevista ao jornal, calou fundo. Ajudou-me a entender porque gosto tanto da cidade-silêncio com suas distâncias ermas, madrugadas vazias, placas de "cuidado! queda de frutas" e maior familiaridade com o céu. "Esse ambiente não acontece no Rio ou em São Paulo, com toda a pressa". É isso. Brasília me emprestou a introspecção de que eu precisava. 

Introspecção então é a palavra? Sim, pode ser, se você preferir assim. Eu, no entanto, não tenho medo da palavra melancolia. Bato na madeira três vezes, visto uma camisa branca, pego minha bike e vou passear no Parque da Cidade*. Lá, tenho um momento de paz. E lembro que meu pai, minha mãe, meus verdadeiros amigos sempre esperam por mim. E vou...





* PARQUE DA CIDADE - Com 4,2 quilômetros quadrados de puro verde (e cinza do asfalto da pista de cooper e ciclovia que circunda toda sua extensão) em pleno coração da capital federal, o Parque da Cidade Dona Sarah Kubitschek é, segundo o jornal Correio Braziliense, o maior parque urbano do mundo. Não sei se é verdade, mas, para efeito de comparação, o Central Park tem 3,4 quilômetros quadrados.










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