domingo, dezembro 03, 2006

Domingo, 03 de dezembro de 2006

A Vida (nem sempre) é Bela

O bom senso recomenda não tampar o sol com a peneira. Via de regra, medidas paliativas para não enfrentar a realidade tendem a, em longo prazo, se tornar desastrosas. Vai daí que a vida nem sempre é bela, quase nunca é mole e sempre será tortuosa.

Por que escrevo isto? Porque acabo de assistir ao filme o Labirinto do Fauno. E o que tem a ver? É que quando o filme acabou, fiquei me sentindo vingado. É como se o diretor mexicano Guillermo Del Toro tivesse dado resposta à altura à ridícula fábula do italiano Roberto Begnini, A Vida é Bela. Esqueçam o trailler. Não levem seus filhos, sobrinhos ou afilhados para assistirem O Labirinto. Este, definitivamente, não é um filme infantil.

Ao garoto tornado quase autista pela superproteção paterna, Del Toro contrapõe outra criança atingida pela tragédia. Uma menina. Ao invés de fazer piadas às custas dos horrores da Segunda Guerra e do Holocausto, o mexicano mostra a violência da guerra civil espanhola e como a barbárie pode facilmente se sobrepor à fantasia. Em certos momentos, Del Toro estiliza a violência, fazendo-a parecer gratuita. Mas, prestando atenção, ao assistir à cena final, fica difícil não entender seu recado. O sobrenatural pode causar medo, mas é a realidade que impõe dor. Principalmente aos que, conforme se confessa uma das personagens em dado momento, são covardes.

quinta-feira, novembro 30, 2006

quinta-feira, 30 de novembro de 2006

Acho que eu nunca escrevi a palavra xixi. Urina sim. Mas o popular xixi, nunca. Quer dizer, não que me lembre. Talvez eu até tenha escrito enquanto aprendia a escrever, só para ver como ficava ‘desenhada’ no papel. Assim, tipo criança repetindo palavrão. Ocorre que, se o fiz, não me lembro. E não apenas xixi. Tem um monte de palavras cotidianas com que convivo sonoramente que são ignoradas graficamente por mim, que ganho a vida escrevendo palavras dignas como inconstitucional, desenvolvimento, presidência, intransigentemente, etc

Estava pensando em bobeiras que nunca escrevei quando me lembrei de um outro episódio envolvendo palavras que me surpreendeu. Mas desta outra vez foi algo que ouvi. Apesar da palavra - na verdade, um nome – me ser familiar, me dei conta de nunca tê-la pronunciado alto antes. Estava sentado no meio-fio esperando pela minha mãe. Ao meu lado, alguém que não me lembro quem (devo estar com algum problema de memória!) a chamou: “Nair”. Pensei comigo, “Vejam só. Não é que o nome da minha mãe é bonito".
Me dei conta de que durante toda minha vida, eu só a chamei por mãe. E fiquei imaginando como devia ser conviver com um nome bonito durante boa parte da vida e, de repente, perdê-lo.

segunda-feira, novembro 27, 2006

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

Databus informa: Em Belo Horizonte, a passagem de ônibus mais barata custa R$ 1,85.

Tem oito dias desde minha chegada à capital mineira, de onde retornei no último sábado e onde passei a última semana trabalhando de onze a treze horas diárias. Direto, sem pausa. Não deu para conhecer muito além do trajeto Aeroporto/hotel/UFMG, onde acontecia o 3º Encontro Educacional do Mercosul. Por sorte - ou, azar - o Aeroporto de Confins faz jus ao nome. Fica, realmente, próximo aos confins do mundo. De van, são cerca de 40 minutos sacudindo pelas ruas em obra até o centro.

Pela janela do táxi, ou nas rápidas caminhadas noturnas pelo centro, para ir jantar, deu para sacar que a cidade é dinâmica, que o barato é louco, o vapor é total e, principalmente, que é verdade factual a história de que Belô é uma das cidades com a maior concentração de mulher bonita do país. Lógico que, diante da relatividade do conceito, não vou eu, semi-fosco afetado pela saudade da namorada e pelo cansaço de uma semana ouvindo falar em integração dos povos do bloco, querer que me acreditem. Para los chicos, vale a pena conferir com os próprios olhos. Recomendo uma mesa do Western House, de preferência na calçada da Rua Guajajara, altura do 466, no Centro.

De mais a mais, não tenho muito mais o que escrever. Poupo-os, eventuais leitores e amigos, dos detalhes das discussões infinitas, das deliberações e recomendações dos intermináveis grupos de trabalho, das falas ministeriais. Sim, voltei de bode. Cara amarrada e abatido. Não quero nem ouvir falar em desarollo, en la educación como um bien público y en la integración de la educación de los hermanos. Cansei. Como diz a atriz do Terças Insanas, "Me deixem ser burro. A inteligência dói".

quinta-feira, novembro 16, 2006

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Perigos Capitais

Brasília é uma capital muito perigosa. E olha que eu nem mesmo estou me referindo ao entorno, às cidades-satélites da capital federal. Não. Falo unicamente da Ilha da Fantasia composta pelo Plano Piloto e pelos Lagos Sul e Norte.

Enquanto caminha pelas entrequadras, se o sujeito incauto escapa de ser atingido por uma jaca, é vitimado por uma manga. Ou por um abacate. Ou, no melhor dos casos, por um jambolão que, ainda que eventualmente lhe manche a roupa, pelo menos não oferece o risco de um traumatismo.

É realmente necessário andar esperto em Brasília. E não pensem que o perigo se resume à flora. Não! A fauna também oferece sérios riscos à saúde, principalmente dos novos candangos. Quando não à integridade física, aos nervos dos mais sensíveis. Por exemplo, as cigarras de Brasília (aliás, no início de cada primavera, melhor seria dizer Brasília das cigarras, pois é como se todas migrassem para cá. Pelo menos minha namorada garante que em Florianópolis não há cigarras. Segundo ela, lá é terra de formiga, de trabalho).

Seguindo o raciocínio, as cigarras, em Brasília, distraem, irritam e fazem mal ao sono. Não bastasse elas começarem a cantar tão logo o sol aparece no horizonte, elas não respeitam a lei do silêncio e, vez por outra, se põem a cantar tarde da noite. E não apenas uma. São milhares. No meio do dia você já se esqueceu de como soa o tráfego, as ruas, o aspirador de pó, sem o fundo sonoro das cigarras.

Eu, semi-fosco que sou, dia destes consegui ser atingido por uma nos olhos. Isso porque eu uso óculos. Pois nem assim. A desgraçada conseguiu entrar entre meus olhos e a lente do óculo. E ficou ali, batendo asas, eu sentindo o frêmito na pálpebra do olho esquerdo...


É, Brasília é realmente muito perigosa.

segunda-feira, novembro 13, 2006

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Voltando após quase duas semanas sem postar. E, como de hábito, segunda-feira é dia de despretensiosamente comentar algo sobre o que li, assisti, ouvi durante a semana. Pois bem...

UM LIVRO - O Alienista. Será o melhor conto de Machado de Assis? Não saberia dizê-lo, pois além de entender pouco do riscado (na verdade, em se tratando de literatura, entendo apenas do que gosto e não gosto), conheço quase nada de Machado. Até bem pouco tempo, gostava de polemizar menosprezando a unanimidade em torno de sua obra. Dizia a todos que preferia Lima Barreto (ainda prefiro, mas, hoje, já admito que isso é pessoal). Acho que a culpa por esta minha rebeldia era das professoras do ensino médio, que nos obrigam a ler livros inacessíveis - pelo menos, na época, para mim - à nossa sensibilidade de adolescentes criados em meio à cultura audiovisual.

Mas voltando à dica, muitos afirmam ser o melhor conto do autor. Para quem não leu ou não lembra do que leu apenas para fazer a prova, a editora LP&M disponibilizou a obra através da coleção Pocket, que é boa e barata. Além disso, para os mais preguiçosos, o conto tem uma vantagem. Exige folêgo curto, já que tem apenas 86 páginas, tamanho pequeno. Ao menos um livro do Machado já se poderá dizer ter lido.

UM VÍDEO - Tudo bem. Chamem-me de obsessivo, de exagerado. Até de quinta-coluna. Mas volto a indicar um filme argentino. O Cachorro, de Carlos Sorín.
O filme não é o melhor da recente leva de produções argentinas, mas tem muitas das qualidades que as têm caracterizado. Uma história simples, tocante e muito bem contada por um diretor capaz de escalar excelentes atores para os papéis principais. Atores estes capazes de representar a diversificada e complexa gama de sensações e emoções que caracterizam a todos nós. Deixando de viadagem e sendo mais objetivo, O Cachorro é a história de um frentista desempregado que, aos 52 anos, sobrevive às custas de pequenos bicos e dos favores da filha. Tudo vai mal até que, ao prestar um favor a uma desconhecida, ele ganha como pagamento um dogue branco chamado Bombom. Com o cachorro pela coleira, sua sorte vai mudar.
Portas se abrem, cartões de visita e números telefônicos - importantes patrimômios em uma cultura que valoriza o QI, de Que Indica - se multiplicam e, enfim, o protagonista terá a chance de ir além de seus até então estreitos horizontes . Que, vale anotar, em termos naturais, se trata da bela e agreste paisagem da Patagônia. Enfim, mais um belo filme argentino.
UMA EXPOSIÇÃO - Olha só, Cibele. Esta é para os poucos amigos de Brasília que me lêem. Como acho que você e minha namorada são as duas únicas, mas ela já foi comigo, então fica aqui registrada uma dica unicamente para você.
A mostra inédita do indiano Anish Kapoor, Ascension. Embora Kapoor seja basicamente um escultor, quem visitar o Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, não deve esperar pelas clássicas reproduções em pedra ou outros materias convencionais. O artista brinca com as leis da física e utiliza materiais empregados por pintores para propor um jogo com quem vê sua obra. Ou então, recorre à equipamentos emprestados à indústria aeronáutica para, com a ajuda de alguma fumaça, esculpir o vento. Sim, o vento.
Não ficou muito claro? Pois acredite, vai ficar ainda menos óbvio para quem for à exposição de Kapoor, de terça a domingo. Ou você acha fácil explicar a sensação de colocar a cabeça dentro - sim, dentro - de um quadro? Ou ser surpreendido por uma parede aparentemente branca e plana que, súbito, se revela grávida?Pois vá lá e experimente ser envolvido pela fumaça para interferir nas formas de uma escultura. É de graça.
Fica para outro dia o comentário sobre Volver, o novo filme de Pedro Almodovar.

segunda-feira, outubro 30, 2006

segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Esta semana a preguiça venceu.

Queria ir à exposição do artista plástico e escultor indiano Anish Kapoor, em cartaz até o dia 7 de janeiro no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), mas os dias passaram, a semana acabou e eu não fui. No cinema, a mesma coisa. Pretendia assistir ou a Elza e Fred - Um Amor de Paixão ou O Buda. Derrotado pela preguiça, não fui a nenhum dos dois. Não assisti à apresentação do grupo de dança de Florianópolis, Cia. 11, nem à peça de teatro que estava em cartaz a poucos metros da minha casa.

E por que tanto cansaço? Talvez pela batalha que travei para comprar o meu primeiro celular. Se bem que desconfio que foi mais de fundo moral. Abri mão do único título que me distinguia e me tornei mais um cidadão rastreável.

Assim, por hoje, tudo que tenho a sugerir é o vídeo Três Enterros de Melquiades Estrada, dirigido por Tommy Lee Jones e que só fui me animar a assistir após atentar para o detalhe que o roteiro foi escrito por Guilherme Arriaga, o mesmo do excelente Amores Brutos e 21 gramas. No fim das contas, descobri que a direção e a interpretação de Jones também são certeiras.

Já para ler, bem, descobri João Gilberto Noll. Mas sobre este eu prefiro falar numa outra hora, porque agora bateu uma preguiça.

quarta-feira, outubro 25, 2006

quarta-feira, 25 de outubro de 2006






Midiótica
Não pude escrever antes a respeito da discussão resultante da reportagem de capa da edição de CartaCapital da semana passada (ver o post de 17 de outubro). Quando, nesta quarta-feira, reproduzi as capas desta semana, queria fazê-lo. Mas só hoje (sexta) pude comentar algo. Durante todo este tempo, as acusações sobre o papel desempenhado pelos veículos de comunicação nestas eleições causaram a irritação ou a indignação de vários profissionais que se posicionaram ao sabor de suas convicções políticas.

Resumo da ópera para os que não sabem do que se trata: o experiente repórter político Raimundo Rodrigues Pereira publicou na edição de CartaCapital de 18/10 a primeira matéria de, até agora, duas, sobre o tratamento dado pela mídia aos fatos que antecederam a realização do primeiro turno. Leia-se, a exibição das fotos tiradas pela Polícia Federal do dinheiro apreendido na operação que deteve os militantes petistas envolvidos na compra do Dossiê Vedoin.

Em linhas gerais, a reportagem “Os Fatos Ocultos” procura demonstrar que a mídia, em especial a Globo, omitiu informações cruciais ao divulgar as fotos e, assim, contribuiu para que houvesse um 2º turno, prejudicando a candidatura de Lula. Dada a riqueza de detalhes apurados pelo repórter, os editores imaginaram estar, com a matéria, dando sua contribuição a um eventual Dossiê da Mídia.

Além de algumas revelações de bastidores (jornalistas teriam sido avisados da prisão dos petistas por um dos donos da produtora de marketing político que presta serviços a José Serra e a Geraldo Alckmin; as fotos do dinheiro foram entregues a alguns repórteres pelo mesmo delegado da Polícia Federal que, duas semanas antes, havia prendido os petistas), Raimundo levanta dúvidas sobre os procedimentos técnicos e éticos dos profissionais de comunicação. (Por que o Jornal Nacional de sexta-feira (29) teria dado tanto destaque à divulgação das imagens quando concorrentes já falavam do acidente com o avião da Gol?).

A principal questão, porém, é por que os jornalistas teriam omitido de seus leitores/ouvintes/telespectadores a informação de como o cd com as fotos chegara as suas mãos?

Qualquer pessoa minimamente esclarecida sabe dos interesses políticos e econômicos que permeiam a atividade jornalística. Sabe, também, que a credibilidade de um veículo é proporcional a sua capacidade de manter a isenção e a objetividade, possíveis apenas por meio da fidelidade à verdade factual e à compreensão do que é notícia de interesse público (e não do público). Pois então, neste caso, qualquer um saberia também que a informação divulgada com alarde só estaria completa caso os jornalistas revelassem as condições em que haviam obtido as cópias das fotos.

Não se tratava de revelar uma fonte, mas de deixar claro que um delegado da Polícia Federal havia entregue a cinco jornalistas um cd com 23 fotos cuja exibição havia sido desautorizada pela Justiça. Que havia lhes recomendado afirmarem ter recebido o material de alguém que o teria roubado dele próprio. E que, para dar verossimilhança ao álibi, ele, o próprio delegado, disse que forjaria um boletim de ocorrência e insinuaria aos seus superiores que o autor do furto poderia ser um jornalista mais ousado. Segundo Raimundo Pereira, o delegado chegou a recomendar que as fotos fossem editadas a fim de suprimir detalhes e despistar sua origem.

O pior. Toda a conversa entre o delegado e os jornalistas a quem entregou o cd estava gravada e foi apresentada a outros profissionais. Um deles, o repórter da Tv Globo, Luiz Carlos Azenha, chegou a veicular em seu blog (http://viomundo.globo.com) trechos desta gravação. Em uma das passagens, o delegado deixa clara sua principal preocupação ao entregar o material. “Tem de sair hoje à noite na tevê. Tem de sair no Jornal Nacional”.

É como diz Azenha na apresentação de seu blog. "Não dá para mostrar tudo na tevê".

Então, vá à net e tire suas próprias conclusões:


Os Fatos Ocultos – (a reportagem que originou a polêmica)
http://www.cartacapital.com.br/index.php?funcao=exibirMateria&id_materia=5457

Rede Globo: os fatos – (a réplica do diretor-executivo de jornalismo da Central Globo de Jornalismo, publicada inclusive na CartaCapital desta semana, como matéria publicitária paga)
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=403JDB010

Tartufo trabalha na Globo? - (a tréplica de Mino Carta à carta-resposta de Ali Kamel)
http://www.cartacapital.com.br/index.php?funcao=exibirMateria&id_materia=5459

O Fantasma do Paredón – (a opinião do jornalista Alberto Dines sobre a matéria de CartaCpital)
http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=404JDB001

De onde veio o Dinheiro – (texto que o jornalista global Luiz Carlos Azenha publicou em seu blog sobre a montagem cenográfica em torno do dinheiro apreendido pela Polícia Federal)
http://viomundo.globo.com/site.php?nome=PorBaixoPano&edicao=359

Réquiem do jornalismo – (o elogio a Raimundo Pereira, a crítica ao antijornalismo e a opinião do jornalista Luis Nassif)
http://z001.ig.com.br/ig/04/39/946471/blig/luisnassif/2006_10.html#post_18660494

O 1º Golpe já houve. E o segundo? – (a opinião de Paulo Henrique Amorim fica explícita no título)
http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/394501-395000/394778/394778_1.html

Quase mais uma ... (A notícia do ‘laranja’ que não era ‘laranja’ e da jornalista que não era jornalista, ambos à serviço do PSDB, foi divulgada como verdadeira pelos principais veículos da imprensa, ocupando as primeiras páginas de sexta-feira, 27. Para entender, é necessário, após assistir ao vídeo –primeiro link – ler a entrevista que o delegado da PF concedeu a Paulo Henrique Amorim – segundo link)
http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/397001-397500/397246/397246_1.html
http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/397001-397500/397257/397257_1.html

segunda-feira, outubro 23, 2006

segunda-feira, 23 de outubro de 2006

O que li, vi e ouvi e recomendo embora ninguém tenha pedido
Na telona - A estréia nacional Pequena Miss Sunshine, comédia on the road sobre uma famíla autenticamente norte-americana que, apesar da esquisitice e desequilíbrio de seus membros - paranóicos por estarem à altura das promessas do american way of life - se assemelha demais à média das famílias ocidentais.
Particularmente, apesar de achar os personagens carismáticos e o filme divertido, tenho algumas ressalvas. Primeiro, após sugerir o que poderia ser entendido como a crise do modelo familiar tradicional, o filme defende-o da forma mais conservadora possível. Segundo, me parece pedante e desnecessária a opção por sustentar, ou mesmo relacionar, as idiossincrasias do adolescente que se recusa a falar após ter feito voto de silêncio, ou do tio homosexual, às figuras do filósofo alemão Nietzsche e do escritor francês Marcel Proust.
Mas minha principal ressalva é quanto ao fato de ambas as idéias centrais do filme, ou seja, a crítica ao modelo de sucesso imposto pela cultura norte-americana, aqui representado pelo concurso de beleza infantil (Miss Sunshine) e a própria possibilidade de superação dos problemas familiares através da união para atingir um objetivo comum, ou da simples fuga do cotidiano, já terem sido exploradas ao extremo pelo cinema norte-americano. De cabeça, lembro, no primeiro caso, Miss Simpatia. No segundo, Férias Frustradas, um filme também engraçado com o 'mala' do Chevy Chase.
Apesar desta minha rabugice, a platéia parece ter gostado muito do filme e eu próprio dei boas risadas. De forma que fica valendo a indicação. Melhor ainda que, no Brasília Shopping, até o dia 26, o ingresso é promocional, custando a metade do preço.
Na telinha - Um argentino. Sim, qualquer um argentino. A Nuvem, Nove Rainhas, O Pântano, O Filho da Noiva, Menina Santa, Clube da Lua, O Cachorro...Tudo bem. Talvez O Pântano e Menina Santa não sejam palatáveis à qualquer sensibilidade, mas uma década de ótimos filmes me fez concluir que não há, hoje, produção cinematográfica como a argentina.
Nessa semana, assisti a O Abraço Partido (El Abrazo Partido - 96 min.), dirigido por Daniel Burman e vencedor de dois prêmios do prestigiado Festival de Berlim. Conta a história de Ariel, descendente de judeus-poloneses que migraram para a Argentina fugindo aos horrores da Segunda Guerra e ao extermínio de judeus. Criado pela mãe após o pai ter abandonado à família para ir defender Israel durante a guerra do Yon Kipur (1973), o garoto cresce em meio à bugigangas made in china, às histórias pessoais e aos desencontros dos lojistas de uma galeria comercial decadente de Buenos Aires, onde sobrevive a loja de tecidos criada e deixada pelo pai e administrada pela mãe. Sem horizontes após ter largado a faculdade e abandonado a namorada, Ariel planeja tentar a sorte na Europa como cidadão polonês, porém, para isso, tem de remontar seu passado e o de sua família.
Um filme emocionante, engraçado, de atuações carismáticas e roteiro inteligente.
Para ler - A Louca da Casa (Ediouro, 196 pág.). Não li o romance em forma de ensaio da espanhola Rosa Monteiro durante a semana que passou, mas o fiz em igual tempo, no início deste ano. Após muito tempo, foi o primeiro livro que li de um só fôlego.
A louca a que a escritora alude é a imaginação. E o livro é, a bem da verdade, indefinível. Misto de romance, com elementos autobiográficos e, no fundo, um ensaio sobre a importância da imaginação para os criadores, sobretudo para os que lidam com a literatura, e desta para a humanidade. Tudo isso sem a chatice da erudição, como um bom bate-papo.
Para ouvir - Digam o que disserem, Deus salve o E-mule e similares programas de compartilhamento de arquivos. Pois graças a ele, e à dica valiosa de um amigo conhecedor de samba, fui apresentado à malandragem de Roberto Ribeiro (1940 - 1996). Estranho que eu nunca tivesse ouvido falar do carioca, nascido em Campos, ex-jogador do Fluminense e puxador de samba da Império Serrano. Na internet há muito dele para baixar. Eu fiz minha seleção. Mel pra minha dor; Todo menino é um rei, Acreditar, Conto de areia, Viola da Serrinha, Vazio, Favela, Só pra Chatear, Recordações de um Batuqueiro (com Elza Soares), Cartas Marcadas, Proposta Amorosa, Viva meu Samba, Me engana que eu gosto, Sereno da madrugada, Estrela da madureira, Ingenuidade, Cinzas da solidão, Desalento, Triste desventura e Ingenuidade. Só pérolas que, não fosse a democratização possibilitada pelas novas tecnologias, estariam jogadas nos espúrios arquivos das gravadoras multinacionais.

sexta-feira, outubro 20, 2006

sexta-feira, 20 de outubro de 2006


Octopus Surfer
Pelé, Schumacher, Michael Jordan, Robert Scheidt, Muhammad Ali, o belga Eddy Merckx (e não o norte-americano Lance Armstrong), Tony Hawk....O esporte produziu uma seleta lista de atletas cujos feitos transcenderam os limites de suas respectivas modalidades, transformando-os em mitos. Na esteira de vitórias e novos recordes, vieram a fama, o dinheiro, as mulheres – o que contribuiu para que, além de darem o devido retorno a seus patrocinadores, se tornassem ainda mais populares e, conseqüentemente, angariassem mais fama, dinheiro, mulheres....No surf, este cara se chama Kelly Slater.

Apontado como o melhor surfista de todos os tempos, Kelly se destaca por ser completo, dominando qualquer tipo de onda, em qualquer condição. Seja voando sobre a junção de merrecas, seja dropando atrasado e entubando fundo em ondas grandes ou perigosas como Teahupoo, no Taiti, o norte-americano parece sempre pronto a expandir os limites do esporte.

Não bastasse ter igualado, ainda no início da temporada 2006, o recorde de seu conterrâneo Tom Curren, outra lenda do esporte que venceu 33 etapas do circuito mundial, Kelly, na semana passada, ensinou jornalistas e surfistas a pronunciarem a palavra OCTACAMPEÃO.

Não é pouca coisa. Merecidamente, o floridiano (estado conhecido pela má qualidade de suas ondas) é o profissional mais bem-sucedido da história do surf – esporte em que os atletas só começaram a colher os benefícios da profissionalização no final da década de 70. Desde que, em 1992, com 20 anos, se tornou o mais jovem campeão mundial, Kelly foi capa de revistas extra-surf como Interview, participou do seriado Baywatch, namorou a ‘siliconizada’ atriz Pamela Anderson e a ubermodel Gisele Bundchen, emprestou seu nome para um jogo de vídeo-game, estrelou dezenas de vídeos de surf e campanhas publicitárias, publicou uma precoce autobiografia e surfou por quase todo o mundo. Agora, com 34 anos, ao vencer seu oitavo título, Kelly se torna o surfista mais velho a conquistar o tour mundial.

Mesmo que os jornais não tenham noticiado seus feitos, diga, ele é ou não o cara? Caso concorde, me faça um favor. Se acaso esbarrar com um pretenso jornalista esportivo, pergunte a ele sobre a trajetória de Kelly. Caso ele não o conheça, mande-o à merda.

terça-feira, outubro 17, 2006

terça-feira, 17 de outubro de 2006

AGENDA SETTING


"O mundo parece diferente para pessoas diferentes, dependendo do mapa que lhes é desenhado pelos redatores, editores e diretores dos jornais que lêem."
(Bernard Cohen, The Press and Foreign Policy, 1963)

segunda-feira, outubro 16, 2006

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

Aquilo não era um cachimbo, não era a mamãe, e isto não é um blog cultural. Mas mesmo que minha opinião não valha à pena, me dêem a chance de brincar de crítico cultural, nem que por exercício. Amigos, aguardo comentários, opiniões e críticas de quem já tenha lido, assistido, ouvido ou visitado a qualquer uma das sugestões que eu indicar, se tudo der certo, a cada segunda-feira.

Para assistir na telinha - De início, indicarei dois, pois não estou certo de que o primeiro, a produção hispano-argentina Na Cidade Sem Limites, de 2002, esteja disponível em vídeo, já que o assisti no Cine Brasília, durante a Mostra de Cinema Espanhol. De qualquer forma, o filme de Antonio Hernandéz surpreende ao tornar um drama familiar em um excelente suspense onde nada é óbvio, sejam as relações familiares, seja a própria doença que acomete o pai e motiva a reunião familiar em um hospital de Paris.
Na impossibilidade de encontrar esta fita, fica valendo o brasileiro Nina (www.ninaofilme.com.br), primeiro longa-metragem do diretor Heitor Dhalia . Livremente inspirado no romance Crime e Castigo, do russo Dostoievski, o filme recorre aos traços do igualmente atormentado desenhista Lourenço Mutarelli para dar vida às angústias e alucinações da personagem principal, excelentemente interpretada pela atriz de A Grande Família, Guta Stresser. Além disso, o diretor mostra ter credibilidade e ser bem-relacionado, pois pode se dar ao luxo de contar com um elenco de feras: Selton Mello, Wagner Moura, Lázaro Ramos, Matheus Nachtergaele, Renata Sorrah, Juliana Galdino e a ótima Myriam Muniz, um assombro no papel da velha Eulália.

Para assistir na telona – Já indiquei, anteriormente, o indie Eu, Você, Todos Nós. Assim, atualizo a dica com um filme que acaba de estrear. Dália Negra, o novo policial do diretor Brian de Palma é pipoca, mas das que têm a qualidade de proporcionar prazer momentâneo. Além de trazer beldades como Scarlett Johansson, Hilary Swank e Mia Kirshner (tudo bem, vá lá! Para as garotas, tem também o atual queridinho Josh Hartnett), prende a atenção do espectador. Algumas cenas violentas são dispensáveis, mas, afinal, isso é Hollywood.

Para ouvir em casa – Nem que seja por ocasião dos dez anos de morte de seu vocalista e letrista, Renato Russo, acho que vale a pena (re)escutar com atenção os discos da Legião Urbana. Nem que seja para verificar se suas músicas e as letras escritas por aquele que, a meu ver, foi o maior letrista do rock brasileiro, continuam dizendo algo sobre nosso tempo.

Para ler no Parque da Cidade ou na praia – Os textos são bons, embora sejam o que, em jornalismo, se chama de frios, ou seja, que não tem data de validade porque não são factuais. De qualquer forma, o lançamento da revista Piauí (R$ 7,50) foi “o fato” para o mercado editorial. E como é uma empreitada do diretor de videodocumentários João Moreira Salles (Notícias de Uma Guerra Particular, Entreatos), filho de banqueiro e irmão do Walter Sales de Central do Brasil, é lógico que a revista vai virar assunto obrigatório de mudérnos, estudantes de jornalismo e afins. Mas o que me incomodou foi o fato de que continuamos em desvantagem frente à geração anterior. O melhor texto é do Ivan Lessa, o mesmo que, em 60, escrevia para O Pasquim. Ironia fina.

sexta-feira, outubro 13, 2006

sexta-feira, 13 de outubro de 2006

LERO-LERO
Reproduzo aqui as 10 perguntas de ordem moral consideradas realmente relevantes pelo editor do fanzine carioca Outros Baratos - “uma despretensiosa tentativa de registrar em celulose o tom da conversa-fiada que livreiros e clientes do sebo Baratos da Ribeira (www.baratosdaribeiro.com.br) mantém”.

“Já que excesso de cultura pode tornar a vida mais infeliz quando não se tem coragem de errar...porque conhecer melhor o mundo costuma tornar as decisões mais lentas, uma vez que aumentam os detalhes, as alternativas e as consequências a serem consideradas... as perguntas que realmente merecem sacrifício e empenho para serem respondidas, as respostas que nos repartem em partidos e que pesarão no momento de julgarmos e sermos julgados são meia dúzia. Ou um pouco mais. Aqui seguem dez delas:

01 – Em que ponto o resultado de uma fecundação se torna uma pessoa?

02 – O corpo de cada um é um patrimônio pessoal sobre o qual somos absolutamente soberanos ou recursos biológicos que nos são emprestados por um prazo limitado e pelo qual há alguma obrigação de zelo?

03 – Dentro de quais condições e em que medidas a humanidade deve usufruir os recursos naturais?

04 – Qual o máximo de recursos monetários que se deve permitir que uma pessoa ganhe sem que ela tenha trabalhado para tanto?

05 - A privacidade, no sentido do espaço onde estamos livres de sermos julgados, consiste num modo de fazer ou naquilo que se faz?

06 – Qual o tamanho do esforço que a sociedade deve despender para tornar um indivíduo auto-suficiente quando as oportunidades que a média das pessoas recebe não são o bastante?

07 – Quando um crime ou pecado causa tanto estrago que torna impossível ao culpado compensar o mal cometido?

08 – Até onde é possível transformar quimicamente a personalidade de alguém sem que suas vontades e desejos se tornem as do fabricante ou as do psiquiatra?

09 – Quais idéias são tão perigosas que não valhem a pena deixar circular e discutir, já que proibí-las não as tornarão menos convincentes?

10 – Para que serve a Arte?”

quarta-feira, outubro 11, 2006

quarta-feira, 11 de outubro de 2006

Há dez anos, neste mesmo horário, o telefone do hotel onde eu trabalhava, em Santos, começou a tocar. Atendi-o. Era minha então namorada. As duas chamadas que se sucederam também eram pessoais, de amigos muito próximos. Um deles ligava de São Paulo. Os três tinham o mesmo tom de voz embargado e denunciavam a mesma hesitação em reproduzir a notícia que tinham acabado de ouvir: Renato Russo, vocalista da Legião Urbana e principal letrista do rock brasileiro durante a década de 80, estava morto.

Não tenho vergonha de dizer que quando atendi a quarta chamada - esta, de trabalho - estava chorando. Da mesma forma que para meus amigos e para milhares de fãs da Legião Urbana, eu parecia ter perdido alguém muito próximo. Lembro de diversos apresentadores da MTV, Soninha entre eles, consternados, apresentando seus programas com as pálpebras inchadas. Por quase dois dias, shows, entrevistas e clipes da Legião ocuparam quase que a totalidade da grade da emissora.

Hoje, entendo porque. Renato Manfredini Júnior (1960 – 1996) foi realmente muito próximo e teve influência direta sobre a educação sentimental de milhares de pessoas.

Por mais de uma década, desde que, em 1985, o primeiro disco da banda chegou às rádios e estourou sucessos como Ainda é Cedo, Geração Coca-Cola, Soldados e Por Enquanto, as letras de Renato e a postura da banda conquistaram não apenas a simpatia do público, mas uma admiração que levou jornalistas a atribuírem a seu vocalista uma liderança quase messiânica sobre os fãs. Ledo engano. Estes ouviam-no e assimilavam quando ele dizia não haver nada de especial em si mesmo. Ainda que isso contribuísse ainda mais para que o achassem especial, impedia que se tornassem tietes. Assim, Renato não era adorado por ser famoso, por dar entrevistas ou porque aparecia na tevê. Em geral, era admirado pela capacidade de se comunicar com quem o ouvia.

Hoje, lógico, ouço Legião de outra forma. Mas a admiração por suas mensagens não diminuiu. Pelo contrário. Ao ver garotos e garotas que estavam nascendo em 1996 cantando as mesmas músicas que eu cantava nas rodinhas de violão de meus tempos de adolescente, acompanhado por meus amigos, sei que Renato Russo e a Legião deixaram uma obra perene.

segunda-feira, outubro 09, 2006

segunda-feira, 09 de outubro de 2006

A Outra Revolução Necessária
Apartado do Ministério da Educação (MEC) em 1985, o Ministério da Cultura (MinC) cumpre o importante papel de ‘desesconder’ o Brasil. Traduzindo em ações, isso significa, por exemplo, mapear e proteger as expressões culturais locais e elaborar políticas de proteção diante da avalanche produzida pelos conglomerados de mídia e entretenimento. É esse o objetivo quando o ministério se propõe a valorizar a capoeira; a defender o samba-de-roda; a criar pontos de cultura em comunidades carentes a fim de democratizar o acesso aos bens culturais ou ao patrocinar os filmes que vêm sendo produzidos nas periferias, comunidades indígenas e quilombolas: preservar nossa identidade cultural.

Porém, a fatia do bolo que cabe ao MinC é de apenas 0,5% do orçamento total da União. Em 2005, isso significou menos de R$ 350 milhões. Não fossem os recursos arrecadados graças às leis de incentivo fiscal e, provavelmente, o ministério morreria de inanição. A Lei Rouanet, por exemplo, só no ano passado movimentou mais de R$ 600 milhões de reais ao permitir que empresas invistam em cultura parte do que teriam de recolher aos cofres do Estado sob a forma de impostos. Impostos que se transformariam – ou deveriam – em investimentos em Educação, Saúde, Saneamento Básico e...Cultura.

O problema deste modelo, segundo alguns especialistas da área é que, com isso, o governo deixa a cargo da iniciativa privada a responsabilidade por definir o que vale a pena ser visto, lido, ouvido, enfim, conhecido.
Segundo estes mesmos especialistas, o que está ocorrendo, além da privatização da gestão cultural, é que, como nunca, os produtos da indústria cultural se tornaram “mercadorias”. Portanto, valem conforme sua capacidade de oferecer retorno. Daí decorre que o departamento de marketing - a quem geralmente cabe a palavra final sobre quais projetos merecem o aporte financeiro em troca da exposição do logo da empresa - privilegiam o que já é conhecido das massas. No teatro, para ficar em apenas uma expressão artística, são, em geral, os atores já conhecidos graças à tevê os que conseguem amealhar o maior percentual de patrocínios. O pior é que, na certeza de contarem com teatros lotados, estes mesmos atores, ignorando os patrocínios que obtiveram graças à renúncia fiscal, cobram uma exorbitância do público.

Some-se à falta de dinheiro a carência de recursos humanos do MinC (hoje, são 2,5 mil servidores. Correção: A exemplo da CartaCapital, escrevi que há 20 anos o MinC não realiza concurso público. Na verdade, após duas décadas sem contratar, no início deste ano o ministério fez um novo concurso. Os aprovados estão sendo convocados) e está criado o cenário para que surja o abismo entre as propostas apresentadas pelos sucessivos ministros e a real capacidade de ação da pasta.
Como bem lembrou o atual ministro, Gilberto Gil, “a recomendação da Unesco é de que as instituições culturais recebam 1% do orçamento nacional”.
(fonte: CartaCapital, ed. nº 411, 20/09/06)

quinta-feira, outubro 05, 2006

quinta-feira, 05 de outubro de 2006

QUANTO VALE OU É POR QUILO
O que interessa mais ao leitor? A periodicidade ou a informação precisa e atualizada?
Época,Veja e Istoé (R$ 7,90 cada) chegaram às bancas de todo o país no domingo (1º) em que os brasileiros decidiam os rumos políticos dos próximos quatro anos. CartaCapital (R$ 7,50) preferiu atrasar a publicação da edição semanal. Graças a isso, trouxe uma primeira radiografia do resultado das urnas de todo o país. Sem falar das notícias mais atuais a respeito do acidente aéreo em que morreram 155 pessoas.

quarta-feira, outubro 04, 2006

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Ando sem tempo para escrever. E pouco disposto a falar sobre o resultado das eleições. Gostaria de comentar um pouco mais sobre os personagens brasilienses, mais especificamente sobre os que habitam este diversificado centro comercial - e, por que não, cultural - que é o Setor de Diversões Sul (SDS), informalmente chamado por CONIC. Como tenho citado-o repetidamente em meus posts, acho que devo ao menos uma explicação para os amigos que não são de Brasília ou não conhecem o lugar. Mas isso exigiria o tempo e a paciência que andam escassas. Então, fica aqui a sugestão de leitura da pesquisa etnográfica A “SOCIOLOGIA” DE UM EDIFíCIO URBANO: O CONIC NO PLANO PILOTO DE BRASÍLIA, publicada em http://www.unb.br/ics/sol/urbanidades/brasilmarnara.htm
Para quem aceitar a leitura, duas ressalvas. a) Impossível apreender o real significado e a importância de um local como o CONIC - ainda mais em uma cidade como Brasília - em uma visita de fim-de-semana. b) O subsolo do conjunto, à época abandonado, hoje abriga, além de lojas de roupas e quiosques dedicados à venda de cds de rap e hip-hop, uma movimentada praça de alimentação, onde inclusive acontecem, nas noites de quintas e de sexta-feira, happy-hours.

terça-feira, outubro 03, 2006

terça-feira, 3 de outubro de 2006

A gente se vê por aqui

No Plano Piloto, é no Conic que o povo se encontra. O pernambucano Francisco Gonçalves da Silva, o Zé do Pífano, sabe disso. Afinal, não há nada mais povo que um pernambucano que viva da venda dos pífanos que fabrica. Assim, lá vai ele pelos corredores do Conic, entre a admiração e a surpresa dos que param para ouvir sua arte.

sábado, setembro 30, 2006

sábado, 30 de setembro de 2006

7 METROS ABAIXO DO CHÃO
O lugar se chama Espaço Galeria. Um antigo puteiro que foi reformado e transformado em uma pequena e soturna boate escondida no má-afamado Conic. Pra ser exato, no subsolo do Conic (espaço que, por si só, merece um texto que ainda irei escrever).
A festa da vez foi denominada Cicciolina e custava R$ 10 só a entrada. O nome da famosa italiana, estrela de filmes pornôs da década de 80 e, mais tarde, eleita deputada, foi tomado emprestado para, segundo os organizadores do evento, protestar de forma bem-humorada contra as eleições deste domingo. Não foram só as razões do protesto que não ficaram claras. Se alguém se manifestou durante a noite, o fez às escondidas. E ninguém pareceu sentir falta disso. A bem da verdade, a molecada nem deu atenção às imagens exibidas no telão; trechos de discursos, de entrevistas e de campanhas políticas.
Uma dj que prometia tocar música brasileira e ritmos cubanos atendia pela sugestiva alcunha artística de Sarah Vah! (assim mesmo, com exclamação). Além dela, outros três djs dividiam as carrapetas. Todos nominalmente inspirados. Somdubom seleciona funk. Mas funk das antigas, saca aquela coisa de Parliament e Funkadelic. Nada a ver com bondes e tigrões. Já os djs DX e Cookie Valentino! (também exclamativo) apostam ambos na música eletrônica.
Apesar de haver pouca gente - algo positivo, já que a casa é pequena e não comportaria um terço dos habitués da festa que acontece na garagem da Faculdade Dulcina, também no Conic - deu para se divertir. Principalmente para quem, como eu, vindo da festa de despedida de um amigo, já havia entornado uma garrafa e meia de vinho de boa qualidade.
A pista sobrou para quem quis dançar. Para quem preferiu "segurar a criança" (e havia várias delas!), sofás na laterais resgatam os tempos de inferninho da boate. Além do palco onde, lá pelas três da manhã, uma dançarina desnudou seu constrangimento. No jornal haviam anunciado que uma "dançarina provocante iria bailar" e garantir o clima de sensualidade da festa. Não sei se foi a falta dos meus óculos ou se foi o vinho, mas me pareceu que a intenção ainda era debochar de algo. Talvez de mim. Sendo assim, resolvi enfiar o pé na jaca e chamar a atenção de todos para minha dança epilética. Realmente, o pogo não combina em nada com ambientes alternativos como este. Mas a garotada blazé, mistura de lésbicas, gays, roqueiros, descolados, moderninhos e outros, não deu a mínima.
Na próxima sexta (06) rola outra festa neste mesmo local. Irá se chamar Sbornia. Não sei se fará juz ao nome. Mas para preencher a ausência da dj Sarah Vah!, os organizadores escalaram a dj Megera. É, realmente. Estes djs sabem escolher seus nomes artísticos.

sexta-feira, setembro 29, 2006

sexta-feira, 29 de setembro de 2006

A Ponte JK vista do avião

DIVERSÃO E ARTE

Hoje, Lenine bate papo e toca de graça no pocket show da FNAC. Infelizmente, o local comporta apenas 50 pessoas. No Arena Futebol Clube, o Cordel do Fogo Encantado lança seu novo álbum, Transfiguração (R$30). Seguindo a programação musical, tem ainda Jorge Mautner de graça em Taguatinga, Jah Live no Minas Brasília Tênis (R$15), Alzira Espíndola na Funarte (R$5) e o concerto sinfônico gratuito da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional.

Três festas: Cerrado Rock in Concert, Fashion Club e minhas sempre elegidas festas no Conic - a da vez se chama Cicciolina (R$10), uma provocação às eleições deste domingo (Cicciolina, para quem não se lembra, é o nome da estrela pornô Illona Staler, que, em 1980, foi eleita para o parlamento italiano). Se não bastasse acontecer no Conic, o local mais diverso e democrático da capital, tem entre suas atrações uma dj que atende pelo nome artístico de Sarah Vah! rs,rs,rs,rs,rs.

Tem teatro também. Segue a Cena Contemporânea - Festival Internacional de Teatro de Brasília, que ocupa, além de duas salas do Teatro Nacional, a Funarte, o teatro do Centro Cultural Banco do Brasil, o da Caixa e o Sesc Garagem da 913 Sul.

Some-se a isso os 47 títulos atualmente em cartaz nos diversos cinemas de Brasília e mais a penca de exposições e fica fácil de concluir que a vida cultural brasiliense não é tão incipiente quanto pode parecer a quem não procura por boas opções.

quarta-feira, 27 de setembro de 2006

Ele toca violão, canta, discorre sobre passagens bíblicas, discute a natureza da espiritualidade e manteve centenas de internautas na expectativa se conseguiria vencer à distância entre Cachoeira Paulista, no interior de São Paulo, e Brasília, para onde viajou disposto a processar o criador de uma comunidade com seu nome no orkut. Conheça Frei Tim, uma quase celebridade virtual que tem seus passos monitorados pela rede mundial.


ORKUT ON THE ROAD
Frei Tim é quase uma celebridade. Mas não é frei e poucos sabem o que exatamente ele é. Apesar disso, há quem diga que não existe cidadão que não o conheça no município paulista de Cachoeira Paulista. Segundo a estudante Gisele Laurindo, na cidade, Tim é mais famoso do que quentão em festa junina. E, no mundo virtual, mesmo que os números do orkut sejam mais modestos, não são menos expressivos. Já são 310 os fãs cadastrados na comunidade criada em sua homenagem. Pelos tópicos postados, ele com certeza deve ter deixado muitos outros pelo caminho que percorreu nos últimos sete meses.
Após tomar conhecimento de que sua foto estava sendo exibida na internet, Tim decidiu pôr os pés na estrada e seguir em direção a Brasília, onde pretendia processar o responsável por expôr sua imagem e seus causos na rede mundial. A partir daí, a comunidade virtual ganhou outra dimensão. Internautas de diferentes cidades e estados começaram a acompanhar e relatar a peregrinação de Frei Tim. Estava comprovada a justificativa do próprio Adriano para apagar as mensagens pessoais de seu perfil, "neste Admirável Mundo Novo você está sempre sendo observado".
Em março, após deixar Cachoeira Paulista, cidade onde vivia, Tim foi acolhido por moradores do município de Miguelópolis, ainda no interior de São Paulo. Em seguida, Priscilla o conheceu em Varginha, sul de Minas Gerais. Dias depois, chegou a Uberaba (MG), onde bateu um papo de mais de meia hora com Michel.
"Durante nossa conversa ele me contou que é milionário, tocou violão e trompete imaginários, falou algo em pelo menos nove idiomas, me disse que havia tomado seis tiros e, lógico, não deixou de se queixar por estarem usando sua figura para arrecadar dinheiro na Internet. Ele me disse que já teriam conseguido R$ 15 milhões".
Ainda em Uberaba, Frei Tim, apelido com o qual está se tornando famoso o cidadão Luiz Fernando da Silva, foi atendido na Secretaria de Defesa da Pessoa e do Cidadão. Dizendo ser um "ícone de sua cidade natal", ele se queixava por estarem indevidamente usando sua foto em um site. E entregou ao promotor um disquete contendo cópia da comunidade Frei Tim: Eu o Conheço. A comunidade foi criada em abril de 2005 pelo jovem Adriano Santos Godoy, com a intenção de homenagear "o mais célebre andarilho desocupado de Cachoeira Paulista". Segundo o próprio Adriano, "Ele não podia me ver na rua. Perdi a conta das vezes em que ele me atormentou".
No dia 7 de abril, ele estava em Uberlândia (MG), onde deixou Fábia tonta com o teor alcólico de sua conversa. No dia 11, foi visto por Vivaldo em Araguari (MG), pedindo dinheiro e segurando uma sacola plástica com disquetes e uma folha impressa do profile da comunidade do orkut.
Os testemunhos foram se sucedendo à medida que Tim avançava país adentro. Catalão (GO), Campo Alegre de Goiás, Cristalina. Até que, no dia 30 de abril, a fisioterapeuta Rute Rocha deu a notícia. Frei Tim havia chegado à capital. E continuava furioso com Adriano, dizendo que iria encontrá-lo a qualquer custo. "Ué, mas ele estava aqui, na mesma cidade que eu, e foi me procurar em Brasília?", questionou o agora receoso autor da homenagem que provocou esta verdadeira saga.
Desde então, Tim tem perambulado por Brasília, influenciando pessoas e fazendo amigos. "Cheguei em casa às 23h50, guardei minha moto e quando olhei para o lado, o vi. Sujo, com bafo de pinga e me pedindo um pão. Levei um susto e tentei me afastar. Mas quando dei por mim, já estava íntimo desta figura" conta o brasiliense Gelson Gomes. "No começo eu não entendia nada do que ele dizia. Mas descobri que é um ser humano especial, inteligente e bacana. Ele inclusive me ajudou psicologicamente. Sei que ele só foi embora após umas quatro horas de conversa".
Moradora de Cachoeira Paulista, a estudante Tais Mattos diz que ninguém sabe ao certo a história de Luiz Fernando antes de se tornar Frei Tim. "Uma vez perguntei de onde ele era e ele respondeu que era de Vinde e Vede. Foi engraçado". De acordo com a versão mais crível, seu apelido vem do hábito de cumprimentar as pessoas tocando-as com o dedo e dizendo alto, "tim".
Segundo Adriano, por conta de sua simpatia e inteligência, muitas pessoas já tentaram o ajudar. "Você não tem noção da quantidade de gente que já tentou ajudá-lo. Ele não quer ajuda", respondeu o paulista ao brasiliense Liandro Baião, que demonstrou disposição para auxiliar Tim após ter se sensibilizado com seu estado. "Ele apareceu na casa do meu primo pedindo luvas e uma touca para se proteger do frio. Estava alcoolizado e tinha os pés rachados. Carregava quatro ou cinco folhas com todos os recados deixados na comunidade".
Apesar de todo o folclore em torno da figura de Tim, muitos de seus 'fãs' reconhecem sua inteligência. Adriano Sattim conta ter aprendido a respeitá-lo após um bate-papo transcendental. "Conversamos sobre espiritualidade. Ele conhece e respeita muitas religiões e possui um pensamento bem filosófico. Vale a pena explorar suas idéias. Sou fã do Tim".
Porém, como toda celebridade, Tim é uma personalidade controversa. "Encontrei com ele aqui em Brasília uma vez e ele me pediu ajuda, dizendo que precisava entrar na igreja porque o demônio estava falando com ele. Não tinham deixado ele entrar porque ele estava falando outras línguas e rogando pragas. Foi realmente assustador", conta Letícia Dutra.
Os últimos depoimentos dão conta de que Tim está bem, continua em Brasília e que foi aceito na igreja. E que, em breve, sua foto irá se tornar ainda mais conhecida. Mas agora, com sua permissão.
"Meu ministério de música toca todo sábado na Paróquia Nossa Senhora das Dores, no Cruzeiro Velho. Como o Tim gosta muito da gente e nós gostamos dele, fizemos uma votação e decidimos que ele vai virar capa do nosso cd. Claro, isso se ele nos conceder os direitos autorais. Outro dia, depois da missa, ele pegou o violão depois da missa e cantou "Tu és minha vida, outro Deus não há".
Ao que tudo indica, Frei Tim pode vir a se tornar famoso. Entretanto, se por acaso você encontrá-lo pelas ruas de Brasília ou em qualquer rincão do país, pense duas vezes antes de tomar qualquer liberdade. Adriano, que diz ser um dos poucos que já o encontraram sóbrio, garante "Quando não está bêbado ele fica sério e não gosta de brincadeiras".

domingo, 24 de setembro de 2006

Angeli, da saudosa Chiclete com Banana

Quando a bela perde e a fera ganha
Ao que parece, no meio publicitário e artístico, só o amor destrói.
Eis a conclusão do episódio envolvendo a modelo e apresentadora Daniella Cicarelli e seu namorado Renato Malzoni, filmados transando em uma praia espanhola repleta de banhistas.
Na semana em que veio à tona mais uma trapalhada petista - a negociata para compra, por R$ 1,7 milhão, de um suposto dossiê que envolveria o candidato ao governo de São Paulo e ex-ministro da Saúde José Serra à máfia dos sanguessugas, não se falou de outra coisa. Logo após o vídeo com as nada discretas cenas protagonizadas pelo casal ter sido exposto ao voyeurismo de milhares de internautas mundo afora, despertando a inveja, o despeito ou as críticas moralistas de potenciais consumidores, Cicarelli perdeu os contratos publicitários que tinha com a montadora General Motors e com a empresa de telefonia celular TIM. Embora ambas as empresas neguem que a 'paella à Cica' seja o motivo para a não renovação dos contratos, o público interpretou desta forma. Perdeu temporariamente a vergonha, perdeu dinheiro.
O irônico é que enquanto a bela é financeiramente punida por realizar a fantasia sexual de muitos - ou seja, transar na praia; e não necessariamente na de Cádiz, Espanha -, duas feras (em ambos os sentidos) enchem os bolsos graças a um episódio violento que manchou a final da última Copa do Mundo.
O francês Zinedine Zidane segue como estrela comercial de seus patrocinadores, entre eles, a Adidas. O que provocou uma resposta da marca concorrente, a Nike, patrocinadora do italiano Materazzi, agredido pelo primeiro com uma cabeçada. Oportunamente, o desentendimento no gramado ilustrou uma disputa comercial e encheu o bolso de ambos os brigões, independentemente de quem era mocinho e de quem era bandido. Nos nada dialéticos dias de hoje, pouco importa quem tem razão, desde que as posições possam ser embrulhadas e comercializadas.
Resta saber se falta ousadia aos nossos publicitários, incapazes de vender o saudável orgasmo do casal Cicarelli-Malzoni, ou se o consumidor que adquire um tênis associado à imagem de um jogador violento repudia a vinculação da imagem do seu celular com uma transa.

quinta-feira, setembro 28, 2006

terça-feira, 19 de setembro de 2006

A NÁUSEA
De onde surgem um milhão e setecentos mil reais para que os homens de preto comprem dossiês de origem duvidosa?
"Se lembra da primeira vez?
Se lembra da pressa de crescer?
Se lembra das promessas que você fez?
Se lembra das chances que deixou passar?"
Quanto custa dar um tiro no próprio pé? Quanto dói? E para o país? E para a democracia? Quanto custa toda esta merda? Sanguessugas, mensalão, grampo do TSE, compra de votos, dossiês, privatizações suspeitas...E tudo por fazer. E a classe-média comprando Caras; se informando pela Veja!; assistindo ao Jô; indo à missa.
"Se lembra dizendo: "agora eu sei"?
Se lembra errando outra vez?
Se lembra tendo que dizer adeus?
Se lembra momentos que não vão voltar?
Já nem sei se estou contigo
Já nem sei para onde a gente vai
Já nem sei o que faz sentido
Você ainda lembra como era?"
Para criticar a suposta declaração de Lula sobre seu desejo de fechar o Congresso para, assim, poder governar a seu modo, Heloísa Helena afirmou que ele, o Congresso do qual ela própria faz parte, é "corrupto, omisso e cínico como o presidente que o critica".
"Se lembra dos amigos que perdeu?
Se lembra dos sonhos que vendeu?
Se lembra quando era só você e eu?
São momentos que não vão voltar
Já nem sei se estou contigo
Já nem sei para onde a gente vai
Já nem seu o que faz sentido
Você ainda lembra como era?
Se lembra?
Como era?
Se lembra?
Como era?
Se lembra?
Como era?
Se lembra?" *
O senador Cristóvam Buarque, esquecendo-se de suas responsabilidades, afirma à imprensa que embora tenha "provas documentais" de que o presidente estaria usando à máquina administrativa para fazer campanha, não irá denunciá-lo.
"Não é nossa culpa
Nascemos já com uma bênção
Mas isso não é desculpa
Pela má distribuição
Com tanta riqueza por aí, onde é que está
Cadê sua fração"
Em Belém, Lula junta em um mesmo palanque dois dos adversários que disputam o governo do estado, o pemedebista José Priante e a petista Ana Júlia Carepa.
"E cadê a esmola que nós damos
Sem perceber que aquele abençoado
Poderia ter sido você
Com tanta riqueza por aí, onde é que está
Cadê sua fração
Até quando esperar" **
(* Se lembra e ** Até Quando Esperar são canções da banda brasiliense Plebe Rude)

segunda-feira, 18 de setembro de 2006


)) <> ((
FOREVER

Não entendeu o título acima? Então é porque você ainda não assistiu a uma das melhores seqüências cinematográficas já protagonizadas por crianças. Quer dizer, na modesta opinião deste semi-fosco que escreve, as atuações de Brandon Ratcliff, de apenas seis anos, e de Miles Thompson, são decisivas para, além de desmistificar o olhar ingênuo e hipócrita com que o cinema - e as telenovelas brasileiras - normalmente trata as crianças, emprestar a graça e a complexidade que caracterizam o filme de estréia de Miranda July, o excelente Eu, Você, Todos Nós (Me and You and Everyone We Know, EUA-Reino Unido, 2005, 91min. - www.meandyoumovie.com), ainda em cartaz.
Qualquer sinopse deixará a desejar, posto que é difícil resumir a história de Eu, Você... Não apenas porque, ao estilo dos filmes de Robert Altmann, o foco narrativo recai simultaneamente sobre diversos personagens, mas também porque a diretora, sob o pretexto de discutir como pessoas solitárias têm de se esforçar para superar o estado de isolamento contemporâneo, traz à baila diversas outras questões e problemas do relacionamento humano.
De forma superficial, e recorrendo ao site oficial do filme: Enquanto ganha a vida transportando idosos solitários de um lado a outro e procura uma galeria disposta a exibir as instalações artísticas que produz na solidão de seu apartamento, Christine (claro alter-ego de Miranda) conhece Richard, vendedor de uma loja de sapatos que acaba de se separar de sua esposa e luta para manter algum vínculo com seus dois filhos. Abalado pela separação e assustado com a espontaneidade de Christine, Richard impõe limites à aproximação, evitando se envolver. Enquanto isso, seu companheiro de trabalho se envolve com duas adolescentes que estudam na mesma escola dos filhos de Richard. E um dos idosos de que Christine cuida se lastima por ter demorado tanto a encontrar o grande amor.
Sem estragar possíveis surpresas, dizer mais sobre a história é inviável. O filme não é, óbvio, um blockbuster. Tem aquele jeitão caro aos alternativos, conforme seria de se esperar de alguém com o currículo de Miranda, uma artista multimídia.
Artista plástica e videomaker, Miranda escreveu o roteiro, dirigiu e atuou como protagonista deste filme que já ganhou prêmios em importantes festivais como os de Sundance, Cannes, Los Angeles e San Francisco. Além disso, Miranda está prestes a lançar seu primeiro livro de contos e mantém um blog pessoal (http://meandyou.typepad.com).
A estréia de Miranda nas telonas volta a chamar a atenção para as mulheres por detrás das câmeras. A exemplo de Sofia Coppola (As Virgens Suicidas e Encontros e Desencontros) e da argentina Lucrecia Martel (O Pântano, A Menina Santa), Miranda desponta com a promessa de fazer um cinema autoral e ousado.

sexta-feira, 15 de setembro de 2006

foto: Antônio Cruz (Agência Brasil)
CONSCIÊNCIA NÃO É ESCOLHER O 'MENOS PIOR'

Desde 1989 eu tenho sido Lula.

Mesmo após vê-lo ser derrotado - primeiro por Collor, depois, por FHC - contribuí para que ele se elegesse em 2002. Justamente quando a Carta ao Povo Brasileiro sinalizava que, talvez, já não houvesse mais expectativas de que Lula e o PT fossem promover mudanças estruturais radicais. Tudo indicava que, novamente, o país buscaria o caminho da conciliação entre os interesses do lobo e da ovelha.

Quatro anos se passaram e, no próximo dia 1º de outubro, terei de ir a um cartório a fim de justificar meu não comparecimento à seção eleitoral onde voto. É que quase dois anos após me mudar de Santos, ainda não transferi meu título eleitoral. Daí estar impedido de exercer o direito de, conscientemente, ANULAR MEU VOTO.

Se fosse votar, seria esta minha opção. Não porque tenha me desiludido com a administração petista ou porque ache que Lula é ladrão. Não porque o Alckmin é um sujeito inexpressivo que, até outro dia, vangloriava-se de ter chegado ao Palácio dos Bandeirantes no vácuo de Mário Covas, santista que, quando governador, vetou a construção de uma universidade pública na Baixada. Nem tampouco porque o Cristovam tenha se tornado uma caricatura ou porque haja um enorme fosso entre o programa de governo de Heloisa Helena e o conteúdo programático de seu partido, o radical-chic PSOL.

Votaria nulo não só porque desconfio da insistência com que a imprensa e alguns formadores de opinião tentam nos conscientizar da importância do voto, mas principalmente porque, - torno a insistir - conscientemente, não tenho segurança para escolher o melhor candidato. Na atual conjuntura, com instituições combalidas e uma política mesquinha, palaciana, diria que a tarefa é escolher o menos pior. Será isto suficiente? Será realmente esta a arma do povo? Nos dão algumas opções que além de não nos satisfazer, não contemplam a complexidade e a magnitude de nossos problemas e nos convencem de que se não escolhermos a menos pior somos nós os responsáveis pelo desastre social brasileiro. Será isto o exercício democrático possível hoje?

Quanto mais ouço falar na inconsistência do movimento pelo voto nulo, quanto mais me vêem com o velho chavão do analfabeto político, mais me convenço de que talvez seja este o único caminho possível. Por isso digo que votaria nulo por convicção. Convicção de que é necessário aprofundar a crise, roer o osso, para quem sabe assim superarmos nossa apatia. Cada vez mais me convenço de que é o atual sistema que tem de ser repensado. Quem disse que a democracia representativa seria o modelo final de representação política? Esquecem-se os que põem o dedo na cara de quem vota nulo que, ao longo da história, as diversas sociedades se organizaram de muitas formas diferentes.

Recuso-me a trabalhar e ver boa parte dos meus ganhos ser consumidos na forma de impostos que nunca revertem em meu benefício e ainda votar em alguém só porque o outro candidato seria pior.


Madrinha Naninha e o Pós-Sentimento


Eu corria os olhos distraidamente pelas páginas do livro Casais Inteligentes Enriquecem Juntos enquanto a madrinha Naninha cozinhava seu famoso puxa-puxa. Lembrando que ela é daquelas que proclamam seu casto orgulho por ter se casado virgem com o único homem que conheceu em vida, quis saber sua opinião sobre a tese do autor best-seller.

_ Ah, meu filho. Um casal tem de pensar feito uma só cabeça, tudo muito bem ajambradinho. E tem de fazer planos juntos, mas cada coisa na sua hora. O mais importante é encontrar um companheiro de boa índole, honesto. Depois, quando já tiver um passado e nenhum presente além de se deitar a noite e planejar quantos quartos vai ter a casa que os dois gostariam de construir, é natural o casal comece a fazer planos.

Fechei o livro e anotei mentalmente as palavras da madrinha. "Mas madrinha, por que, então, tantos casais que parecem se dar tão bem acabam se separando após algum tempo, mesmo tendo enriquecido?"

_ Ah, isso eu não sei, filho. Talvez porque falte Deus na vida do casal. Não sei. Mas uma coisa é fato. As pessoas hoje não tem mais `pressentimento´. Tem pós-sentimento. Quer dizer, a mulher tá saindo com outro e o sujeito só vai se dar conta na semana seguinte. Leva quinze dias para se aperceber. É a tal da pós-modernidade de que falam. A mulher diz que está indo embora e ele pensa que ela vai à academia, às compras...

Do seu jeito, Madrinha Naninha fala cada coisa sábia.

domingo, 10 de setembro de 2006

SAMBA DE BOCHA
Quem não o conhece, jamais se arriscaria a dizer que um clube de bocha em que é "expressamente proibido dançar juntos e permanecer sem camisa ou em trajes de banho" abrigaria uma roda de samba concorrida. "Coisa de paulista", diriam. Afinal, o salão pequeno e abafado de uma agremiação tradicional de um bairro popular não parece o local mais apropriado para juntar gente à procura de ouvir música de qualidade, se divertir e celebrar a alegria de viver. Além do mais, por que músicos de qualidade tocariam de graça para pessoas de distintas classes sociais, de diferentes faixas etárias e que, amontoadas ao redor do frágil cordão que os separa dos músicos, se mostram à vontade e extremamente felizes? Pessoas que retribuem com sorrisos espontâneos em seus rostos, dançando e, sobretudo, prestando atenção ao cavaco, aos pandeiros, aos surdos e demais instrumentos, reverenciando a boa música executada pelas mãos experientes que, há quase duas décadas, todos os sábados se reúnem no Clube Ouro Verde, sob a égide de nosso lindo e maltratado pendão da esperança.
Antes, bloqueava-se o trânsito de veículos. Depois, para não incomodar a vizinhança, optou-se por espremer todo o público no número 41 da Rua Nove de Julho, no Marapé. Das 20h. até às 24h, horário em que pontualmente os instrumentos se silenciam, é uma sucessão de bons sambas e choros. Nada de pagode mauricinho, que aqui não é lugar de melação. A paquera, se rolar, tem de ser capaz de se desenvolver ao ritmo dos malandros de outrora. E dá-lhe Cartola, Sinhô, João Nogueira, Roberto Ribeiro, Moreira da Silva, Chico Buarque...
Talvez não role de dançar com a gatinha universitária que veio acompanhada por sua turma descolada. Talvez não haja pegação, muito menos social. Ninguém aqui vem para ser visto. Vem para ver e ouvir. Mas, com um pouco de simpatia e ginga, pode acontecer de você ser convidado para dividir uma cerveja ou para trocar uma idéia com um dos muitos personagens que, religiosamente, todos os sábados dão o ar da graça no Ouro Verde, local demasiadamente humano. E o melhor: não terá gastado nada além do que tiver consumido. Nem para entrar, nem para ouvir os músicos que tocam quase que por diletantismo. Pela impressão de satisfação que trazem em seus rostos, isso os mantém vivos.
Não que eles sejam os únicos a se divertir, mas se envelhecer significa saber curtir a vida como os senhores e senhoras que sacodem as cadeiras no Ouro Verde, como o Nelson e demais músicos que comandam a roda, bom, então eu reivindico o direito de envelhecer bem e me ver livre das boates, músicas, roupas e pessoas "da moda".

sábado, 9 de setembro de 2006

Santos
Surfistas devem ser os únicos a ficarem felizes quando o litoral é atingido por uma ressaca como a desta semana. Em Santos, a maré subiu, a água do mar avançou sobre a avenida litorânea, os canais transbordaram, as galerias pluviais não deram conta da vazão, os jornalistas molharam as barras das calças para registrar o fenômeno e os surfistas, bom, os surfistas se ocuparam de se divertir a valer.
De Brasília, pela internet, acompanhei diariamente o gráfico das ondas e as fotos enquanto alguns privilegiados faziam à cabeça em ondas de até dois metros. Até mesmo em frente ao meu prédio, no canal 4, havia ondas. Mas, infelizmente, nem mesmo ocorrendo um ciclone extra-tropical nas proximidades da costa a baía de Santos segura ondulação. Quando chegamos, eu e minha namorada, na quinta-feira, já não havia mais nada. Flat total.


Pitangueiras - Guarujá


Vencido o prazo de validade de cada swell, resta ou ir para o Guarujá, ou se conformar com o meio metrinho gordo do Itararé. Optamos pelo primeiro e, de bicicleta, fomos para a praia do Tombo. Quarenta minutos pedalando.

Mar mexido, água fria, corrente mais forte que o habitual... Em pouco mais de meia-hora no mar, peguei apenas cinco ondas. E nada de excepcional. A isso se limitou meu surf durante esta viagem.

sexta-feira, 8 de setembro de 2006


CONTROVÉRSIAS DE UM COTIDIANO
De volta a Santos. Há um mês eu chegava à Costa Verde (litoral norte de SP e parte do litoral sul-fluminense), vindo da Costa Rica. Hoje, ao chegar a cidade onde nasci e vivi toda minha vida, Santos, me surpreendo ao constatar que, numa estratégia de marketing visando "reposicionar a marca", esta parte do litoral paulista passará a ser estrategicamente chamada como Costa da Mata Atlântica. Coisa de publicitário, com o apoio do principal jornal local.
Porém, longe destas baboseiras, a boa surpresa neste dia da Independência foi assistir, na Oficina Regional Cultural Pagú - Cadeia Velha, ao espetáculo teatral As Controvérsias de um Cotidiano, encenado pela Cia. Teatral Cortição.
A companhia é formada por jovens 'encortiçados', a maioria deles integrantes ativos da Associação Cortiços do Centro (ACC), cujo processo de mobilização popular injetou auto-estima e ânimo novo em parte da comunidade local. A exemplo do que aconteceu com os garotos e garotas que, mirando o exemplo da atual diretoria, sobretudo de sua presidente, a cabeleireira Samara Margareth Conceição Faustino, organizaram o grupo de jovens a que chamam de Djow-Djows. Artisticamente, a participação de alguns deles no filme Querô (que deve ser lançado até o fim deste ano) foi o estímulo que faltava para que assumissem a vontade de atuar e de levar aos palcos uma reflexão sobre as dificuldades, os anseios e os sonhos dos menos favorecidos.
Com as dificuldades de quem tem de ajudar na subsistência familiar somadas às de outros grupos que dão os primeiros passos nas Artes - falta de espaço para ensaiar, necessidade de superar as carências técnicas com criatividade, etc. - ensaiaram por apenas quatro meses antes de se aventurarem a apresentar ao público os primeiros resultados de seu trabalho.
De forma leve e irônica, mas sem abdicar da crítica social, a peça As Controvérsias de Um Cotidiano trata das históricas mazelas sociais que nos condenam ao atraso e ao sub-desenvolvimento, procurando trazer à baila o ponto-de-vista de quem mais conhece os efeitos desses problemas. Com personagens que vão de prostitutas e traficantes até beatas e policiais corruptos, a peça diverte e, em seus melhores momentos, faz refletir.
Estéticamente, não é o tipo de proposta teatral de que gosto. Sobretudo, me pareceu que falta ao grupo aprimorar o texto, discutir melhor e mais profundamente qual é exatamente a mensagem que querem transmitir e buscar um equilíbrio entre a diversão e a reflexão.
Conheço bem parte do grupo e não seria difícil para mim aconselhá-los a ler e estudar mais, a discutirem à exaustão o que querem levar aos palcos e a buscarem referências e conhecer modelos artísticos que contribuam para lapidar o talento natural que demonstram. Talento este que, apesar das deficiências técnicas, cativa o público. Porque o mais importante que pude constatar foi que a platéia, principalmente os mais jovens, pareceu se divertir bastante. E que o próprio grupo transpira um prazer sincero de estar no palco.
Da mesma forma como presenciei, há doze anos, amigos descubrindo a magia do teatro - amigos que hoje vivem desta arte - vi o encantamento no olhar destes jovens. Torço para que eles realmente se comprometam com o fazer artístico. Mas, sobretudo, que mantenham o compromisso com sua comunidade. E que, da mesma forma como o também santista Plínio Marcos, cuja dramaturgia deu voz aos desvalidos que viviam de pequenos biscates neste cenário portuário que os Djow-djows conhecem bem, possam contribuir para dar voz a outros 'encortiçados'. A responsabilidade é grande.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Nomes Anacrônicos


Enquanto a madrinha Naninha se ocupava da cozinha...
Muito se falou em Fonseca, Braz, Pessoa, Bernardes, Vargas, Dutra, JK, JQ, JG, Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel, Figueiredo, Tancredo, Sarney, em ambos os Fernandinhos, em Itamar e em outros cujos nomes o tempo encarregou de apagar do seletivo caderno goiabada da dinda.
Foram tempos conturbados durante os quais a Tia Mariquinha ficou viúva, doou todos os seus bens e passou a morar com os filhos. E Noeme, após se casar com Ocozias, deu à luz Edilva, Edjanira, Edila, Edirce, Esmênia e Edsonina.
Longe dali, Hitler se casou com Stalin e gerou Franco, Salazar, Peron, Getulio Vargas, Mussolini e uns outros tantos ainda em processo de reconhecimento.
O tempo passou na janela e Maurício, que sempre achou seu nome extremamente comum, decidiu que seu filho se chamaria Hermenegildo. Gildo nasceu à mesma época que Otogilson, Otovilmo e Otomilton. Que, além de serem irmãos, são primos dos também irmãos Edson, Edla, Edvane e Edlene. Ingborg não. Embora só brincasse com eles e até se parecesse um bocado, Ingborg é irmão dos gêmeos Ricobert e Rigobert. Com quem não se parece nem um pouco.
Mas Pinochet, Videla, Stroessner, Castello Branco e Fidel também não se pareciam. Pelo menos, não fisicamente.
Orozimbo Neto afina motores automotivos, vive em Santos, onde enche a cara de cachaça e não tem absolutamente nada que ver com a história pessoal da madrinha Naninha. Mas entrou na dança porque Bimba, que também se chama Orozimbo, afina pianos e tem parentesco com os supra-citados. Desconfio que ambos jamais saberão da existência um do outro.
Os amigos só chamam Formaggio pelo carinhoso apelido de...queijo.
Ainda hoje se fala muito de Vargas, Dutra, JK, JQ, JG, Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel, Figueiredo, Tancredo, Sarney, de ambos os Fernandinhos, de Itamar, de Pinochet, Videla, Stroessner e de Fidel. Mas as pessoas os chamam por nomes nem um pouco carinhosos.
Quando fundou a Fazenda Bom Jardim dos Cristais - onde fica a cozinha em que, ainda hoje, em tempos pós-modernos, a madrinha Naninha segue se ocupando de seus doces e bolos - Zezeca não imaginava que iria dar início a esta pitoresca saga familiar em busca do nome mais esdrúxulo.
Tampouco Cabral.

segunda-feira, 4 de setembro de 2006


Algum tempo após ter me mudado para o Distrito Federal, ouvi de uma amiga a frase reveladora sobre a essência desta cidade: Brasília é uma ilha cercada de Goiás por todos os lados. Passado mais algum tempo, me arrisco a dizer que o 'quadradinho' é uma ilha cercada não só de Goiás, mas de Brasil. Tudo bem, não há nada de original nesta minha afirmação. Mas o que fazer se esta parece ser a primeira impressão de todos os novos-candangos que chegam a Brasília?
No centro desta que muitos chamam de 'Ilha da Fantasia' fica o Plano Piloto - incluo aqui o Lago Norte e o Lago Sul - e seus quatrocentos e tantos mil habitantes. População equivalente a uma cidade de médio porte e que desfruta de indicadores sociais belgas. Na sua maioria, são funcionários públicos, militares, profissionais liberais e estudantes vindos de outros estados e que, embora relutantes em fixar raízes, terminam por se embrenhar nas engrenagens da burocracia política-administrativa, vivendo da ilusão de que aqui se decide o futuro da nação. Esquecem-se de que, da mesma forma que eles próprios, os 'representantes do povo' que eventualmente tomam decisões e que, periódicamente, promovem as falcatruas que envergonham os que aqui vivem e trabalham, vieram de outras bandas, de onde efetivamente provêm às pressões que os movem.
Vez por outra, o brasiliense se vê às voltas com o incômodo de uma manifestação de agricultores, um protesto de sem-terras, um 'tratoraço' ou se espanta com a invasão da Câmara dos Deputados. Mas os responsáveis por estas ações, quando não são os estudantes brasilienses descontentes com os altos preços das passagens de ônibus, sempre vêm de outros lugares.
Óbvio que, a exemplo do resto do país, também no Plano se verificam exemplos de nossa desigualdade social. Mas nada que se assemelhe ao resto do país.
Por meio do Fundo Constitucional (aprovado em 2002 (FHC) e implantado no início de 2003 (Lula), o governo federal repassou, só em 2006, mais de R$ 5 bilhões para os cofres do Governo do Distrito Federal. O montante, uma contribuição substancial para garantir a Brasília a distinção de possuir o maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) brasileiro, é aplicado em investimentos de infra-estrutura e no pagamento dos servidores distritais da Saúde e Educação. Para efeito de comparação, o próximo governador do Mato Grosso irá administrar, em 2007, um orçamento de R$ 5,143 bilhões.
Entretanto, Brasília cresceu além do que previam Lúcio Costa e Oscar Niemeyer. Além do conhecido 'aviãzinho', ou seja, o Plano Piloto, onde ficam os cartões-postais pelos quais a capital é conhecida (Catedral, Congresso, etc), o DF conta com 17 Regiões Administrativas. São elas Ceilândia, Taguatinga, Núcleo Bandeirante, Samambaia, Gama, Recanto das Emas, Sobradinho, Planaltina, Brazlândia, Paranoá, São Sebastião, Candangolândia, Núcleo Bandeirante, Cruzeiro, Guará, Santa Maria e Riacho Fundo.
Embora haja pouco paralelo com a realidade das periferias dos grandes centros urbanos, é aqui, nas cidades-satélites, que se verificam as conseqüências das desigualdades sociais. Falta de policiamento, escolas em mau estado, falta de creches, transporte precário, etc, etc, etc. Além disso, em todos estes lugares, um problema nacional amplificado pelo populismo e pela falta de uma política fundiária. Um em cada quatro habitantes do Distrito Federal vive em condomínios ou parcelamentos urbanos irregulares. Ainda que, de um total de 545.651 pessoas, 69% sejam de baixa renda, a maioria das construções são confortáveis, típicas casas de classe média alta.